Amazônia – Governo reconhece o primeiro mosaico brasileiro de Áreas Protegidas que reúne TIs e UCs

O Mosaico do Oeste do Amapá e Norte do Pará tem extensão de mais de 12 milhões de hectares e é formado por três Terras Indígenas (TIs) e seis Unidades de Conservação (UCs). Incide parcialmente sobre 11 municípios no Amapá e cinco no Pará. Fruto de um longo processo de diálogo, mapeamento da situação local e construção de propostas e cenários futuros comuns, o Mosaico fortalece a perspectiva de um planejamento regional integrado entre Áreas Protegidas.

Territórios habitados por povos indígenas de dois troncos linguísticos diferentes, Karib e Tupi-Guarani, florestas públicas concebidas para uso direto de seus recursos, parques com finalidade de conservação, pesquisa e turismo e um território concedido a uma população extrativista por reconhecimento de seu modo de viver sustentável. Esta é a configuração do mosaico reconhecido no início de janeiro, com cerca de 12.400.000 hectares de contínuo florestal em uma das regiões mais conservadas do Brasil e do mundo: Amapá e norte do Pará, na margem esquerda do rio Amazonas, que reúne três Terras Indígenas (TIs) e seis Unidades de Conservação (UCs) em âmbito municipal, estadual e federal.

A Portaria Nº4 de 03/01/2013, do Ministério do Meio Ambiente, publicada no Diário Oficial da União de 04/01/2013 reconheceu o primeiro Mosaico brasileiro a incluir Terras Indígenas em sua composição. O reconhecimento ocorre sete anos após o inicio do processo, incluindo diálogos, articulação, mapeamento das diferenças e similaridades nos contextos regionais específicos e construção de perspectivas comuns para o futuro. A solicitação de reconhecimento foi enviada ao do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) em janeiro de 2012.

Compõem o mosaico as UCs e TIS relacionadas abaixo e ilustradas no mapa (ver: http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3717) :

:: Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque e Floresta Nacional do Amapá, UCs federais sob a gestão do ICMBio;

:: Floresta Estadual do Amapá e Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Iratapuru, – sob a gestão da Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Estado do Amapá;

:: Parque Natural Municipal do Cancão, sob a gestão da Secretaria Municipal de Meio Ambiente do município de Serra do Navio;

:: Reserva Extrativista Beija-Flor Brilho de Fogo, sob a gestão da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Turismo do município de Pedra Branca do Amapari;

:: Terra Indígena Wajãpi, Terra Indígena Parque do Tumucumaque, Terra Indígena Rio Paru D´Este, as três, homologadas pela Presidência da República e sob gestão das comunidades indígenas e da Fundação Nacional do Índio (Funai).

O Parque Nacional (Parna) Montanhas do Tumucumaque é a maior de todas as áreas, aliás, a maior UC federal do Brasil, com aproximadamente 3.860.000 hectares. Em seguida vem o Parque Indígena do Tumucumaque, homologado em 1997 e de extensão bem próxima, com 3.071.070 hectares. As menores áreas são as UCs municipais, o Parque Municipal Cancão, com 370 hectares e a Reserva Extrativista Beija-Flor Brilho de Fogo, com 68.524 hectares, um território considerável para uma UC municipal, correspondendo a pouco mais de 7% do município de Pedra Branca do Amaparí (AP).

Quase 90% da vegetação original do Mosaico é coberta por floresta ombrófila densa, embora outras formações como savana e regiões de contato entre savana-floresta ombrófila e savana-formações pioneiras também ocorram em menor proporção. Há ainda a ocorrência comprovada de fauna ameaçada de extinção como a onça-pintada (Panthera onca) e o pacu (Mylesinus paucisquamatus), dentre outras centenas de espécies animais e riquíssima diversidade de plantas e microbiota que mantém a dinâmica dos complexos processos ecológicos regionais.

Criado o Conselho Consultivo

Além do reconhecimento do Mosaico, a Portaria do MMA também criou o Conselho Consultivo com a competência de propor diretrizes e ações para compatibilizar, integrar e otimizar as atividades desenvolvidas em cada UC, tendo em vista, especialmente os usos na fronteira entre unidades, o acesso às unidades, a fiscalização, o monitoramento e avaliação dos Planos de Manejo, a pesquisa científica e a alocação de recursos advindos da compensação ambiental. Destaca ainda a competência para manifestar-se sobre propostas de solução para a sobreposição de unidades e manifestar-se sobre outros assuntos de interesse para gestão do mosaico.

O Conselho é composto por 14 representantes de órgãos públicos, sendo um de cada uma das seguintes organizações: Prefeitura Municipal de Laranjal do Jari, Secretaria Estadual do Meio Ambiente do Amapá, Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente), Instituto de Florestas AP, Instituto de Meio Ambiente e Ordenamento Territorial do Amapá, Funai, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Universidade Federal do Amapá; um gestor de cada uma das seis UCs que compõem o Mosaico e 16 representantes não governamentais, sendo cinco extrativistas moradores do entorno e usuários da Reserva de Desenvolvimento Sustetntável (RDS) Rio Iratapuru, cinco representantes de populações de agricultores estabelecidos em assentamentos na Floresta Estadual do Amapá e cinco representantes das populações indígenas dos grupos Wayana, Aparai, Kaxuyana, Tiriyó e Wajãpi, por meio de suas organizações ou associações; e um representante de Organização não governamental reconhecida na região do Mosaico com atuação voltada a questões socioambientais.

Desafios a enfrentar

Embora esteja localizado em uma das regiões mais conservadas do mundo, o cenário do Mosaico Oeste do Amapá e Norte do Pará já está repleto de desafios. A carência por sustentabilidade financeira e a alta rotatividade dos representantes de alguns órgãos públicos, prejudica a participação das instituições e fragiliza a continuidade de ações no âmbito de Mosaicos. Além disso, em virtude de das atuais políticas governamentais desenvolvimentistas que visam ampliar obras de infraestrutura como estradas, hidrelétricas e exploração de gás e mineração na região amazônica, a pressão sobre a floresta, seus rios e povos é enorme.

A partir de uma análise cartográfica realizada pelo ISA com dados da própria Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), vinculada ao Ministério de Minas e Energia, há quatro usinas hidrelétricas (UHEs) e nove Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) planejadas que incidem no Mosaico (confira no mapa acima). A pressão da mineração não é menos impactante. Há 1.033 processos incidentes nas áreas que compõem o Mosaico, de acordo com análise do ISA a partir de dados de outubro de 2012, do Departamento Nacional de Pesquisa Mineral(DNPM). Embora apenas 190 estejam entre as fases de autorização de pesquisa, concessão de lavra, disponibilidade, lavra garimpeira ou licenciamento, os demais 843 requerimentos também podem significar grande ameaça à integridade socioambiental das áreas, principalmente em virtude da reabertura da discussão do Projeto de Lei Nº1610/1996, que dispõe sobre a exploração e o aproveitamento de recursos minerais em TIs. Veja o mapa e clique para ampliar (VER: http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3717 ).

Mosaico otimiza recursos

A proposta de constituição do Mosaico de Áreas Protegidas da Amazônia resulta da articulação de um conjunto de organizações da sociedade civil e de órgãos públicos – federais, estaduais e municipais –, que atuam no Amapá e norte do Pará e se uniram com o objetivo de criar um instrumento de gestão integrada e participativa de um conjunto de Áreas Protegidas e seu entorno. Tal articulação relaciona-se ao lançamento do edital do Fundo Nacional do Meio Ambiente Nº 01/2005, que abriu processo de seleção pública para projetos voltados à “formação de mosaicos de Unidades de Conservação e outras áreas legalmente protegidas”. Submetido ao FNMA, o projeto “Unidades de Conservação e Terras Indígenas: uma proposta de Mosaico para o oeste do Amapá e norte do Pará”, elaborado pelo Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé) foi aprovado.

Ao articular diversas Áreas Protegidas, a figura do Mosaico permite otimizar os poucos recursos humanos, financeiros e materiais de dispõem os gestores e moradores da região. Ao oferecer um espaço de interação e coordenação entre órgãos governamentais de diferentes escalões e representantes comunitários, o mosaico estabelece uma lógica colaborativa, a partir da qual podem ser executadas ações integradas como operações conjuntas de controle e fiscalização, envolvendo o compartilhamento de recursos humanos, estrutura física, logística e equipamentos. Os mosaicos ainda desempenham um papel extremamente relevante na diminuição de conflitos e de fatores de pressão ambiental em uma dada região.

A partir da aproximação entre diversos segmentos da população, se criam oportunidades de sensibilização de comunidades presentes ao redor de Áreas Protegidas que, não raro, estão direta ou indiretamente envolvidas com as atividades predatórias que as impactam. Essas populações muitas vezes são desassistidas, vivem em condições bastante precárias, e, não tendo um entendimento claro sobre o papel destas Áreas Protegidas – que na prática representam o cerceamento de práticas de acesso e uso de recursos – terminam por invadi-las a fim de realizar caça, pesca ou extração ilegal de madeira para poder se manter.

Neste sentido, ações de sensibilização, a criação de um espaço de interação para a redefinição de formas de convivência, o estabelecimento de alternativas de atividades produtivas sustentáveis, bem como de mecanismos de participação e responsabilização de habitantes que residem no entorno de Áreas Protegidas podem reduzir as infrações. A proposta de gestão integrada e participativa vinculada ao Mosaico pode, além disso, suscitar o fortalecimento de uma identidade local, proporcionando espaços de diálogo entre gestores, técnicos, habitantes, representantes de populações tradicionais e outros atores e grupos locais que podem se (re)conhecer e identificar conhecimentos, práticas, limites e desafios comuns.

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