A Terceira Margem – Parte DI

Descendo o Rio Branco

National Geographic n° 82, 06.01.2007

TIRSS na Mídia Nacional – Parte IV

Mata Delimita a Fronteira Agrícola

O Coronel do Exército Gélio Fregapani, um dos mais respeitados especialistas em questões amazônicas, acha que tanto a agricultura quanto a pecuária jamais conseguirão espaço na mata densa. Não pela resistência dos ambientalistas, mas por recusa da própria floresta. Na floresta úmida, explica, as árvores crescem em ritmo rápido demais. A umbaúba é a primeira a aparecer. À sua sombra a mata floresce. Em dois anos, as imbaúbas já superam os 40 metros de altura, conta o autor de “AmazôniaA Grande Cobiça Internacional” [Thesaurus Editora, 2000]. Fundador do Centro de Instrução de Guerra na Selva, Fregapani sustenta que a gritaria dos ambientalistas vocaliza interesses americanos. Ele discorre com igual ousadia os possíveis efeitos do desmatamento:

Os madeireiros não causam à selva o mal que os ambientalistas vivem maldizendo” ‒ garante. “Pegam espécies selecionadas, que interessam ao mercado. Isso não resulta em qualquer dano à floresta, porque há milhões de pequenas árvores, filhotes, que esperam a chance de chegar ao Sol para crescer”. Como a devastação avança, tomara que tenha razão.

Mitos: Efeito Estufa e Pulmão do Mundo

As queimadas na Amazônia não estão entre os cam­peões de emissão de gases que contribuem para o efeito estufa. O fogo na região joga na atmosfera en­tre 0,24 e 0,42 milhões de toneladas de gases ao ano.

No planeta, a atividade corresponde a 2 milhões de toneladas. O Brasil, portanto, seria responsável por até um quinto dessas emissões. O que contribui com 75% para os gases estufa é a queima de derivados do petróleo. O Brasil responde por apenas 3% dessa atividade em relação a outros países do globo. Ao se somar as queimadas de árvores e de combustíveis fósseis, como os derivados do petróleo, o Brasil é responsável por apenas 6% dos gases que produzem o efeito estufa. O apelido de “pulmão do mundo” dado à Amazônia, pela suposta produção de oxigênio, também é injusto.

Pesquisas mostram que as árvores da região retém apenas pequeno percentual de CO2 na atmosfera. A floresta consome todo o oxigênio que produz. Caso contrário, avaliam especialistas, o nível desse gás na atmosfera estaria em crescimento, o que não ocorre.

Um Quinto da Água Doce do Mundo

A Amazônia concentra, sozinha, 20% da disponibilidade de água doce não congelada do mundo, e 80% do líquido se encontra em terras brasileiras. A região corresponde ainda a 34% de todas as reservas florestais, sem falar na enorme quantidade de minérios presente na mata. O Amazonas é o Rio mais extenso do mundo, com 6.671 quilômetros. A bacia hidrográfica tem 1.100 Rios. Diariamente, o Rio Amazonas joga 15,5% de toda a água doce que deságua nos oceanos além de grande quantidade de resíduos, que traz desde a cordilheira dos Andes.

Sivam: Projeto Polêmico e Inoperante

O Sistema Integrado de Vigilância da Amazônia foi concebido no fim da década de 1980, mas só começou a ser implantado em 1994, financiado pelo Banco de Exportação e Importação dos USA.

Inaugurado em 25.07.2002 como um grande empreendimento, com satélites, radares, aviões, estações de recepção de imagens e mais de 200 plataformas de coletas de dados para a proteção da Amazônia Legal, custou US$ 1,4 bilhão. Desde o início, empresas estrangeiras não poderiam participar da implantação do sistema, mas a americana Raytheon venceu a francesa Thompson e ficou responsável pelo SIVAM. A licitação chegou a ser considerada fraudulenta, por suposto favorecimento da empresa americana. A suspeita recaía sobre possível vazamento de informações para os Estados Unidos. Houve ainda denúncias de que os equipamentos instalados já eram obsoletos. A vigilância aérea, por exemplo, só detecta o invasor quando já se encontrava sobre o território nacional, quando a partir dos anos 80 todos os países conseguiam captar objetos voadores a três ou quatro mil quilômetros da fronteira.

PAC Promete Obras Polêmicas

O Programa de Aceleração do Crescimento [PAC], anunciado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, prevê a construção de 3 grandes e polêmicas obras na Floresta Amazônica.

As usinas hidrelétricas de Belo Monte, no Pará, Santo Antônio e Jirau em Rondônia, ainda não tiveram aprovados os relatórios de impacto ambiental e foram alvo de ações do Ministério Público. No caso de Belo Monte, uma liminar da Justiça embargou as audiências e parou o projeto.

A Amazônia na “National Geographic

A revista National Geographic, n° 82, publicou 31 páginas sobre Amazônia, que chegou às bancas no primeiro dia do ano. O texto, considerado alarmista por autoridades brasileiras.

Diz que no tempo que o leitor demorar para ler a reportagem, uma área equivalente a 150 campos de futebol terá desaparecido da floresta. Fala da globalização que estaria invadindo a Amazônia e acelerado a destruição.

Diz a reportagem:

No Brasil, as consequências da exploração da madeira quase sempre são mais danosas que a própria extração. Uma vez que as árvores são derrubadas e os madeireiros seguem adiante, as estradas proporcionam acesso a uma explosiva mistura de posseiros, especuladores, fazendeiros, lavradores e, invariavelmente, pistoleiros.

O repórter Scott Wallace prossegue:

A apropriação ilegal de terras ‒ possibilitada por corrupção, táticas violentas e escrituras forjadas ‒ é uma prática tão comum que tem um nome específico: grilagem.

A revista entrevista o Governador Blairo Maggi, a quem chama de “rei da soja” e até “motosserra de ouro”, em alusão ao título concedido pelo Greenpeace.

Índios Ganharam 65 Novas Terras

No primeiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva homologou 65 reservas indígenas ‒ média de 16,2 terras anualmente. A área corresponde a 106 milhões de hectares. A média de demarcações foi inferior à atingida pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, 18,1 terras por ano.

A maior reserva que deverá ser homologada por Lula será Trombeta Mapuera, entre Amazonas, Pará e Roraima. Tem quatro milhões de hectares e aproximadamente 500 índios de pelo menos duas tribos.

Desmatamento Menor em MT

O Sistema de Alerta de Desmatamento [SAD] revelou que o desmatamento no Mato Grosso caiu 59% em outubro do ano passado. São 460 km2 contra 1.120 quilômetros do mês anterior. A maior parte desse desmatamento, que corresponde a 75%, ocorreu em propriedades rurais. Já nas áreas destinadas à reforma agrária, o desmatamento avançou ‒ 24% do total desmatado em outubro do ano passado. De todo o desflorestamento, apenas 8% foi feito de acordo com a lei, respeitando as áreas da reserva.

Eles já Estão Entre nós [Mariana Carneiro]

BOA VISTA ‒ Os estrangeiros já chegaram e estão entre nós. Fundações, organizações não-governamentais e pesquisadores de outros países formam uma comunidade tão densa quanto a própria Amazônia em solo brasileiro. E, acredite, grande parte deles circula no país com pouco ou quase nenhum controle das autoridades nacionais. O superintendente da Polícia Federal em Roraima admite que são reduzidas as informações sobre a atividades desses grupos na sua área de fiscalização. Afirma Cláudio Lima:

A gente sabe que tem muitas ONGs estrangeiras por aqui, inclusive nas comunidades indígenas, mas não sei o nome. Os estrangeiros não passam pela Federal daqui, vêm direto de Brasília.

No Ministério Público Estadual de Roraima, a vigilância tampouco é praticada. Enfatiza o procurador Geral do Estado, Edson Damas:

Monitoramos as fundações, mas grande parte dos grupos, inclusive de estrangeiros, forma associações, que são entes privados e sem qualquer gerência do governo. Não há legislação que trate do controle das atividades dessas ONGs.

A presença de estrangeiros na região é quase tão antiga quanto as primeiras missões católicas que chegaram ao Brasil com o objetivo de catequizar indígenas no Grão-Pará. Mas merece especial atenção nos dias de hoje, quando o conhecimento técnico e científico ganha cada vez mais valor. Haja visto o enorme número de patentes de espécies e produtos brasileiros nas mãos de japoneses, americanos e alemães, como a copaíba, o camu-camu e o açaí. A reportagem do Jornal do Brasil encontrou, dentro de uma comunidade indígena, uma placa em inglês, na qual se identificava um investimento feito por um laboratório internacional.

Trata-se do International Centre for Scientific Culture [ISFC], que se autodenomina uma ONG e que um dos objetivos ‒ descritos no site do grupo ‒ é promover “a livre circulação de informação científica e de pesquisadores, em particular via agremiações e programas de visitação”. No Surumu, distrito da cidade de Pacaraima, dentro da reserva indígena Raposa Serra do Sol, onde foi vista a placa, ninguém soube precisar qual seria o fim da ajuda estrangeira. A informação apurada pela Polícia Federal é de que o laboratório instalaria no local um ambulatório de remédios fitoterápicos. “Ensinar os índios a usarem fitoterápicos é, no mínimo, curioso” ‒ ironiza uma fonte na PF.

Relatório da Agência Brasileira de Inteligência [ABIN], feito em 2005, mostra que há mais de uma centena de ONGs estrangeiras na região Amazônica. A situação mais grave, segundo a agência, é no Estado de Roraima, em função das extensas terras indígenas. A maior parte da região de fronteira, com a Venezuela e Guiana Inglesa, está dentro de áreas demarcadas, distantes da influência do Exército e da Polícia Federal.

A ABIN apurou que integrantes de instituições europeias visitam com frequência as terras indígenas, sem qualquer controle dos órgãos oficiais. “Há líderes que dizem que não precisam do governo, pois há muitos dólares à disposição” ‒ narra Jonas Marcolino, um dos líderes da Comunidade do Contão, na Raposa Serra do Sol. A Polícia Federal de Roraima já enviou ao IBAMA um pedido para que sejam identificadas as instituições que tem autorização para atuar na coleta de animais e plantas na região. O objetivo é centrar fogo contra grupos que travestem investigações científicas de ajuda social ou preservação do meio ambiente. Avisa o delegado de Meio Ambiente da PF de Roraima, Ivan Gonçalves.

Quem estiver fora da área permitida coletando informa­ções será preso.

ONG é Suspeita de Grilagem de Terras

A região do Baixo Rio Branco, no sul de Roraima, é o novo foco das investigações sobre a ação de estrangeiros no Estado. Em 1999, a Assembleia Legislativa de Roraima abriu uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar a suspeita de grilagem de terras pela ONG Associação Amazônia. O grupo registrou em um cartório em Manaus a compra de 172 mil hectares na Amazônia. Mas, segundo apurou a CPI, a compra nunca existiu, pois a titularidade das terras sequer era da população local.

No relatório, entregue ao Ministério Público e à Polícia Federal, o argentino Héctor Daniel Garibotti seria o dono da ONG, financiada por entidades como a “New Found Land” e a “Fundação Kleinworth”. Um técnico da Embrapa chegou a ser sondado para trabalhar em associação com o “Instituto Ítalo-latino Americano”, com pesquisadores da Universidade de Salermo.

Na época, um representante do governo do Canadá me ligou pedindo que intercedesse pela ONG” ‒ acusa o presidente da Assembleia Legislativa de Roraima, Messias de Jesus. Um inquérito foi aberto no MP estadual, mas ninguém foi responsabilizado criminalmente.

Alemanha Vigia as Reservas

Associar-se aos estrangeiros na ocupação de terras na Amazônia não é coisa de índio. O principal programa de vigilância das comunidades indígenas no Brasil é financiado, quase integralmente, pelo governo alemão. O Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal [PPTAL] começa a instalar as primeiras unidades na Raposa Serra do Sol. O projeto foi instalado no Brasil no início dos anos 90, sob pressão do G7, grupo dos sete países mais ricos do mundo.

Entregues à Própria Sorte [Mariana Carneiro]

BOA VISTA ‒ Se é verdade que os estrangeiros aumentam, a cada dia, sua influência na Região Amazônica, é também fato que a ocupação ocorre, em grande medida, justamente nas áreas em que o Estado brasileiro se mostra mais ausente.

Para o Procurador-geral do Ministério Público Estadual de Roraima, Edson Damas, a influência externa ganha fôlego mata adentro graças à falta de políticas públicas para a ocupação da região. Edson Damas avalia:

Existe um vácuo deixado pelo Estado e, assim, outras forças acabam suprindo essa deficiência. Vêm as ONGs e oferecem o que o governo não dá, os benefícios a que nunca tiveram acesso.

Através do CIMI, a Igreja Católica Exerce Forte Influência Sobre 117 Malocas Indígenas

Segundo o Vice-coordenador da comunidade de Maturucá, na Raposa Serra do Sol, Martinho Macuxí Souza, o Governo Federal não fez nada além de assi­nar a homologação da reserva. De amparo mesmo, só houve um trator obtido, com muito esforço, junto ao Governo do Estado. Na comunidade, estão reunidos mais de 300 índios e o apoio é feito pelo Conselho Indigenista de Roraima, entidade ligada à igreja católica e um dos braços do Conselho Indigenista Missionário [CIMI] e que está presente em 117 malocas em Roraima. Desabafa ele:

Se houvesse algo que o Estado ajudou a fazer, mostraria.

A comunidade tem um centro de costura e artesanato para as índias, além de uma oficina de solda e marcenaria. Tudo foi feito com o apoio dos missionários italianos, assim como a instalação de pontos de coleta de energia solar e um posto de saúde ‒ mais bem equipado do que o de muitas capitais do país. Enumera Martinho:

Precisamos de máquinas para produzir. Bolsa-família não serve para a gente. Isso é bom para quem não quer trabalhar. De que adianta R$ 60, R$ 90? Precisamos de tratores, caminhões.

Mas se acerta na melhoria de vida dos indígenas, a autogestão coloca em xeque a unidade nacional. “Terra, Identidade e Autonomia” são os princípios inscritos nas paredes das escolas indígenas de Roraima. No Surumu, na reserva Raposa Serra do Sol, a formação dos jovens índios mistura história dos povos da América e conhecimentos básicos de química e agricultura.

Além da língua materna, os índios têm na grade curricular o português e o espanhol. O objetivo é formar futuras lideranças, capazes de dar fôlego ao movimento de afirmação de sua cultura e de seu território. E as comunidades indígenas são tratadas como nações.

O resultado mais visível dessa ação é observado por meio de uma palavra estranha aos brasileiros, mas já conhecida do vocabulário de índios, brancos e mestiços de Roraima: a desintrusão.

Com a homologação de terras indígenas, os não índios devem sair dessas áreas, desapropriadas pela União. Na Raposa Serra do Sol, a comunidade cabocla já está instalada por quatro gerações e, aos poucos, é retirada da região. Quando o JB esteve na comunidade de Maturucá, os homens da tribo estavam na cidade de Socó “forçando os brancos que receberam a indenização por suas terras saírem”.

Segregação de Brancos e Índios Deixa a Região mais Vulnerável aos Estrangeiros

Explica Martinho:

Os filhos de índios ou casados com índios que quiserem ficar poderão, desde que não recebam a indenização. E quem ficar, deverá integrar a nossa causa.

Para Jonas Marcolino, líder da comunidade do Contão, uma dissidência na Raposa, à segregação entre brancos e índios deixa a região ainda mais vulnerável à ação de estrangeiros. Afirma:

Retirar os brancos significa que eles estavam habitando outro país. Isso não tem cabimento. Há lideranças que acreditam que está sendo construída uma nação indígena. Se não for subjugada pela nação brasileira, será por outra nação. (JDB, N° 294) (Continua…)

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 26.10.2022 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

Bibliografia   

JDB, N° 294. Americanos Lideram Invasão Estrangeira – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Jornal do Brasil, n° 294, 28.01.2007.   

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;  

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: hiramrsilva@gmail.com.     

NOTA – A equipe do EcoAmazônia esclarece que o conteúdo e as opiniões expressas nas postagens são de responsabilidade do (s) autor (es) e não refletem, necessariamente, a opinião deste ‘site”, são postados em respeito a pluralidade de ideias.