Justiça Federal mantém obrigação da Funai de executar plano de ação para atendimento a indígenas venezuelanos em RR

MPF pede que Funai implemente plano para garantir direitos sociais, econômicos e culturais aos refugiados por crise humanitária na Venezuela

Arte: Canva com edições Comunicação/MPF

A Justiça Federal manteve sentença que obriga a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) a executar plano de ação para atendimento a indígenas refugiados em Roraima, em decorrência de crise humanitária na Venezuela. O plano destinado aos povos venezuelanos Warao e E’ñepá foi idealizado pela própria Funai em 2018, após recomendações do Ministério Público Federal (MPF), mas até hoje não foi executado.

Diante da omissão da Funai, que atribui o atraso à falta de recursos orçamentários, o MPF entrou com ação visando a proteção da cultura e da saúde dos indígenas que se encontram em situação de extrema vulnerabilidade e precariedade, desde 2015. Para o MPF, o poder público não pode alegar limitação orçamentária para justificar a omissão na prestação de serviços públicos imprescindíveis à garantia de direitos mínimos.

Em 2021, ao julgar procedente a ação, a Justiça Federal em Roraima determinou que a União fornecesse todos os recursos financeiros e técnicos necessários e que a Funai comprovasse o cumprimento de ações concretas na implementação das políticas públicas. Na sentença, a Justiça citou ainda relatos de alcoolismo, consumo de drogas por crianças e adolescentes, cooptação de indígenas para prática de condutas ilícitas como tráfico de entorpecentes, além da superlotação de abrigos e indígenas em situação de rua.

Decisão – A Funai e a União apresentaram recurso contra a sentença, que foi negado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), no dia 30 de junho. O Tribunal fundamentou a decisão no princípio constitucional da dignidade humana, que garante a brasileiros e estrangeiros residentes no país uma série de direitos, que também foram estendidos pela doutrina aos estrangeiros não residentes.

Citando leis e decretos federais, sobre princípios e diretrizes da política migratória e medidas de assistência emergencial para acolhimento a refugiados por crise humanitária, além de acordos e convenções internacionais, o Tribunal concluiu pela “evidente omissão da Funai no que se refere à acolhida, à assistência e à preservação dos povos indígenas venezuelanos que se encontram em fluxo migratório para o Brasil”.

“A inércia em promover medidas práticas para a proteção dos refugiados venezuelanos compromete os direitos sociais dos povos indígenas, bem como a política indigenista como um todo, caracterizando omissão do poder público”, traz trecho do voto do desembargador federal Souza Prudente.

Cumprimento provisório da sentença – Em março de 2022, o MPF apresentou pedido de cumprimento provisório da sentença, alegando que aguardar o fim do julgamento colaboraria com a morosidade na implementação do plano de ação. No documento, o procurador da República Alisson Marugal pediu a intimação da Funai e da União para que comprovem, no prazo de dez dias, o cumprimento da sentença, sob pena de multa.

Marugal aponta que as políticas públicas efetivadas anteriormente estão sendo limitadas ou descontinuadas por conta de cortes orçamentários da União e que a atuação da Funai continua discreta e insuficiente. “Se o plano estivesse sendo cumprido, certamente a Funai estaria exercendo função de protagonismo nas mencionadas tratativas, contribuindo para a efetivação de um diálogo permanente e eficaz entre os indígenas venezuelanos e as autoridades brasileiras”, destaca trecho do documento.

O procurador da República ressalta ainda que, apesar da atribuição constitucional do Ministério Público de defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas, “o órgão com expertise e competência para fazer a intermediação culturalmente adequada nesse caso delicado é a Funai, responsável por estabelecer as diretrizes e garantir o cumprimento da política indigenista no Brasil”.

Decisão na Apelação Cível 1000145-20.2019.4.01.4200 – Consulta processual