Garimpo de ouro em minas de aluvião deixa rastro de poluição no rio Madeira

Poluição por metais tóxicos no maior afluente do rio Amazonas foi identificado em estudo de pesquisadores brasileiros e australianos.

Foto: Arquivo A Crítica

Apesar de ter entrado em declínio a partir de 1985, o garimpo de ouro em minas de aluvião nas margens e no leito do rio Madeira, no Estado do Amazonas, tem deixado um rastro de poluição por metais tóxicos no maior afluente do rio Amazonas.

Um estudo feito por pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Rio Claro, em parceria com colegas da Queensland University of Technology, da Austrália, encontrou um nível relativamente alto de mercúrio acumulado em sedimentos de lagos do rio Madeira – gerado pela extração artesanal de ouro.

Os resultados do trabalho, apoiado pela Fapesp no âmbito da modalidade São Paulo Researchers in International Collaboration (SPRINT), foram publicados na revista Ecotoxicology and Environmental Safety. O estudo tem a participação de pesquisadores da Universidade Federal de Rondônia (Unir) e da Shenzen University, na China.

“Embora tenha diminuído a intensidade da extração de ouro por mineração artesanal e de pequena escala no rio Madeira nas últimas duas décadas, essa atividade continua a ser a principal fonte de emissão de mercúrio que encontramos em sedimentos de lagos daquela bacia”, disse Daniel Marcos Bonotto, professor da Unesp de Rio Claro e primeiro autor do estudo, à Agência Fapesp.

O projeto é o segundo que Bonotto realiza com apoio do SPRINT da Fapesp. O primeiro foi em 2016, quando ele se associou a Trevor Elliot, professor da Queen’s University Belfast, da Irlanda, em um estudo sobre traçadores ambientais para a gestão de recursos hídricos.

“O SPRINT favorece a mobilidade e a identificação de projetos em colaboração com pesquisadores do exterior, mesmo que ainda não estejam formatados”, disse Bonotto.

Colaborações internacionais

A criação de novas parcerias em pesquisa é justamente um dos objetivos do SPRINT, modalidade que completa cinco anos. Lançada em abril de 2014, com o objetivo de promover o avanço da pesquisa científica por meio de colaborações entre pesquisadores vinculados a universidades e instituições de pesquisa no Estado de São Paulo e cientistas parceiros no exterior em projetos conjuntos de médio e longo prazo, essa estratégia de organização da Fapesp oferece financiamento para a fase inicial de colaborações internacionais em pesquisa – o chamado seed funding (financiamento semente).

“A expectativa da Fapesp é que o seed funding oferecido, somado aos recursos da universidade parceira, permita aos pesquisadores interagir em um projeto e, ao mesmo tempo, desenvolver uma colaboração que leve a uma proposta de pesquisa conjunta de médio ou longo prazo a ser submetida à Fundação e às agências estrangeiras acessíveis pelo pesquisador parceiro”, disse Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp.

Como explicou Marilda Solon Teixeira Bottesi, assessora para colaborações em pesquisa da Fapesp, os objetivos do SPRINT são consolidar parcerias de pesquisa já existentes ou estimular novas colaborações por meio do financiamento de missões científicas.

“Por meio dos projetos apoiados pelo SPRINT, os pesquisadores participantes têm a oportunidade de visitar as instituições e conhecer os laboratórios e as pesquisas conduzidas por seus parceiros e, com isso, propor projetos conjuntos”, disse.

A parceria de Bonotto com pesquisadores australianos, por exemplo, permitiu ampliar a investigação que o grupo dele na Unesp iniciou ainda na década de 1990, quando começaram a coletar sedimentos de diferentes profundidades e rochas circundantes de lagos do rio Madeira, em Porto Velho (RO), a fim de avaliar as concentrações e determinar as fontes de mercúrio.

O metal tóxico, que representa um risco para a saúde ao ser ingerido por meio do consumo de peixes, pode contaminar as águas do Madeira naturalmente ao ser transportado do solo para cursos de água, ou pelas emissões atmosféricas de erupções vulcânicas dos Andes. Além disso, também pode ser gerado pelo garimpo de ouro de aluvião, explicou Bonotto. “Chegamos a presenciar durante estudos em campo o descarte direto de mercúrio por garimpeiros em lagos do Madeira”, disse Bonotto.

A fim de estimar a contribuição de fontes naturais e do garimpo de ouro de aluvião para as concentrações de mercúrio encontradas em lagos do rio Madeira, os pesquisadores fizeram uma análise dos dados de sedimentos e de rochas de nove lagos, baseada em redes bayesianas.

Esses modelos gráficos, que representam de forma simples as relações de causalidade das variáveis de um sistema, têm sido usados para entender redes ambientais complexas, como para a predição de abundância de espécies em função de características de hábitat.

“Nossos colegas da Austrália, especialistas nessa abordagem estatística, acharam interessante tentar usá-la para avaliar a contribuição das diferentes fontes de emissão de mercúrio em lagos do rio Madeira com base nos dados de sedimentos que coletamos”, afirmou Bonotto.

Os resultados das análises indicaram que, embora as formações geológicas e do solo dos ecossistemas amazônicos influenciem o transporte de mercúrio nos lagos do rio Madeira, o garimpo de ouro de aluvião tem uma grande parcela de contribuição na geração do metal encontrado nessa bacia.

Os pesquisadores constataram que os sedimentos de fundo dos lagos apresentavam concentrações significativamente mais elevadas de mercúrio do que as rochas circundantes – o que afasta a hipótese dessas últimas serem a fonte de emissão do metal.

Uma vez que a mineração de ouro diminuiu significativamente na região nos últimos anos, as emissões anteriores de mercúrio por essa atividade contribuíram para as altas concentrações do metal encontradas nos sedimentos dos lagos, apontaram os autores do estudo.

“Normalmente, os sedimentos de fundo de lagos costumam reter muitas evidências de poluição. As colunas de sedimentos que coletamos, por exemplo, de diferentes profundidades, retêm registros de poluição por mercúrio de vários anos”, disse Bonotto.

Agora, em colaboração com os colegas australianos da Queensland University of Technology, Bonotto pretende usar a mesma abordagem estatística para estimar as fontes de emissão de cromo pela indústria de calçados de Franca em rios da região. “Também queremos avaliar a influência de nitrato no transporte de urânio em águas subterrâneas do aquífero Guarani, no Estado de São Paulo”, disse Bonotto.

O SPRINT tem quatro chamadas por ano. As propostas devem ser apresentadas sempre até a última segunda-feira dos meses de janeiro, abril, julho e outubro. A primeira chamada deste ano, com prazo final para envio de propostas até 29 de abril, bateu o recorde de instituições participantes. São 16 instituições de diversos países.

O SPRINT já apoiou mais de cem projetos de pesquisa realizados por pesquisadores vinculados a universidades públicas e privadas e a instituições de pesquisa sediadas no Estado de São Paulo em colaboração com cientistas da Inglaterra, Estados Unidos, Austrália, França, Holanda, Canadá, Irlanda, Irã, Argentina, Espanha, África do Sul, País de Gales, Escócia, Alemanha, Bélgica, China, Suécia, Chile, Japão e Dinamarca.

Elton Alisson (Agência Fapesp)

FONTE: A CRÍTICA

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