Madeireiros invadem terras de índios que vivem isolados na Amazônia

Você sabia que o povo mais ameaçado de extinção em todo o mundo vive no Brasil? São índios, alguns deles vivem isolados na Floresta Amazônica e jamais tinham feito contato com o homem branco. Agora, imagine o susto, a sensação de pavor desses índios, quando eles perceberam a presença de madeireiros invadindo o território deles, dando tiros, derrubando árvores. Só restou correr desesperadamente em busca de socorro. 

Ihoro conhece todos os sons da floresta. Mas aquele barulho ele nunca tinha escutado antes. Nem nunca tinha visto aquele tipo de pessoa. Homens brancos, invasores, dispostos a destruir e matar. Foi preciso fugir, abandonar a sua terra para sobreviver.

O Fantástico foi ao noroeste do estado do Maranhão e seguiu para uma aldeia da tribo Awá. Pela primeira vez uma equipe de televisão foi autorizada a chegar tão perto de um índio que até alguns dias atrás nunca havia feito contato com a civilização. Ihoro, nome que na língua tupi quer dizer “gavião real”, tem cerca de 20 anos.

Uma aparência rude, mas muita doçura no olhar. Roupas ainda causam estranhamento. Ele vivia isolado em um pedaço da Floresta Amazônica, mas acabou encurralado por madeireiros. Há três meses, foi resgatado por um grupo de índios caçadores e levado para uma aldeia.

Cacique Macumã: O Ihoro contou a história assim: ‘atirou tiro de espingarda atrás de mim’.

Fantástico: Ihoro teve medo?

Cacique: Tem medo, medo. Ihoro tem medo.

Namatiá passou pela mesma situação. Há seis anos, teve que deixar a vida nômade e morar em uma aldeia.

“Eu morava com meus três irmãos na floresta. Nós fugimos dos forasteiros para as profundezas da floresta”, conta Namatiá.

Os Awá estão espalhados por quatro terras indígenas: Alto Turiaçu, Awá, Caru e Araribóia. A mais devastada, a Awá, perdeu mais de 35% do território de 2010 a 2013.

“Sem a natureza, sem a mata, nós também acaba”, diz o índio Awá Tiparajá.

Eles têm uma dependência profunda da floresta. Nela caçam, colhem frutos. Sem as árvores, a mata, passam fome. Segundo a ONG inglesa Survival International, defensora de tribos no mundo todo, o povo Awá é o mais ameaçado de extinção do planeta.

“Primeiro porque eles são nômades e os povos nômades são muito vulneráveis porque ninguém realmente sabe o que está acontecendo porque eles estão bem escondidos dentro da floresta. Então é muito fácil derrubar a floresta e até matar eles. Está acontecendo. Também porque eles são muito poucos em número”, diz a historiadora da ONG, Fiona Watson.

Hoje, de acordo com a Fundação Nacional do Índio, a Funai, existem apenas 400 Awás.

“Se a gente considerar que o Brasil é um dos últimos dos países com a presença de povos indígenas isolados, dentro do Brasil o povo Awá-Guajá estaria no grau de alta vulnerabilidade, ou seja, ameaçado realmente de um crime de genocídio, que está sendo perpetrado por essas atividades ilícitas, de exploração de madeira”, destaca Carlos Travassos, coordenador geral de índios isolados da Funai.

Ameaçados e condenados ao desaparecimento, eles gritam por socorro. E um contra-ataque foi montado pelo Ibama e pela Funai. Durante alguns dias, nossa equipe acompanhou uma Operação do Grupo Especial de Fiscalização do Ibama. E a equipe embarcou no helicóptero.

Do alto observa-se os danos, os madeireiros já não abrem grandes clareiras, apenas derrubam as árvores que tem maior valor comercial. Assim, mesmo com as imagens de satélite, nem sempre é possível estimar o tamanho real do desmatamento.

“Há que se endurecer as leis ambientais. Os crimes ambientais dão no máximo quatro anos de prisão, geralmente as pessoas que são condenadas, passam a entregar cestas básicas, a pagar serviços comunitários”, explica o diretor de proteção ambiental do Ibama, Luciano Evaristo de Menezes.

Por uma estrada os madeireiros escoam boa parte das toras cortadas na floresta. Por isso, a equipe de fiscalização decidiu montar um acampamento e passar a noite para tentar interceptar os caminhoneiros. Choveu forte a noite toda. Essa e outras estradas viraram lamaçais. Caminhoneiros não arriscaram passar pelo local, mas outras trilhas revelam marcas recentes de pneus e levam os agentes aos cenários dos crimes. Máquinas, um acampamento inteiro na carroceria de um caminhão. Em outro ponto, o acampamento foi abandonado às pressas.

As toras são transportadas num caminhão caindo aos pedaços. Não tem placa. O veículo, segundo a equipe de fiscalização, está com o chassi adulterado – foi roubado em algum canto do país. E dentro da cabine, a gente vê uma curiosidade: o tanque de combustível feito totalmente no improviso.

Até plantações de maconha foram encontradas em terras indígenas. A estratégia é destruir tudo, inclusive grandes serrarias. No entorno e dentro das terras Awá, o Ibama já fechou 173 delas. Esta já havia sido alvo da fiscalização no ano passado.

“O objetivo é descapitalizar o infrator. Na verdade são criminosos que estão roubando e receptando madeira da terra indígena e da unidade de conservação. Eles sentem no bolso prejuízo”, diz o agente ambiental do Ibama Roberto Cabral.

O dono do negócio, quem realmente lucra com o a extração ilegal, se esconde. Na linha de frente, os agentes encontram apenas pessoas vítimas de exploração e trabalho escravo.

“As populações do entorno, as populações não indígenas são muito carentes, há uma dificuldade de geração de renda dessas populações que acabam se envolvendo também com atividades ilícitas”, destaca Carlos Travassos, coordenador geral de índios isolados da Funai.

“Dessa vez, trabalhei trinta dias de graça. Não me pagaram aqui. Queria me espancar no barraco aqui ainda. Me bater no barraco”, diz um madeireiro.

Fantástico: Tinha muita gente trabalhando com o senhor?

Madeireiro: Tinha mais ou menos umas vinte e cinco pessoas trabalhando aqui.

Fantástico: Cada pessoa cortava, então, quantas árvores?

Madeireiro: Um máximo de 15 árvores, 15, 20 árvores.

Somente nesta frente clandestina, cerca de 500 árvores foram derrubadas por dia.

“Os índios são os primeiros defensores da floresta, quer queira, quer não, os madeireiros temem os índios. Então devemos preservar o índio e preservar a floresta”, diz o diretor de proteção ambiental do Ibama, Luciano Evaristo de Menezes.

“Nós estamos aqui para lutar pela nossa mata, pela nossa floresta, que é isso que nós vamos deixar para os nossos filhos e para os nossos netos”, diz a índia.

Não são só os Awá que se sentem ameaçados na região. Os Guajajaras perceberam que precisam se unir para tentar frear o desmatamento na terra indígena. Eles criaram um grupo pequeno, formado por 24 índios. São os chamados guardiões, que vão vigiar e fiscalizar os pontos ilegal de exploração de madeira.

“Eu já fui ameaçado várias vezes, mas isso não vai me intimidar”, afirma o cacique Antonio Guajajara.

Em menor número, os Awá se mostram mais frágeis. “Os brancos mataram minha mulher e meu filho. Eles foram mortos na floresta com uma arma feita de ferro. Eu era pai e um dos meus filhos morreu”, conta um índio.

Mas há uma palavra na língua branca que resume o que eles estão dispostos a fazer: resistir.

“Desaparece toda uma visão de mundo, toda uma história de um povo, seus conhecimentos, mas acho que também desaparece uma parte da riqueza e da diversidade da humanidade. Todos nós perdemos”, destaca a historiadora da ONG, Fiona Watson Ihoro e a família, que moravam longe da civilização, aprendem agora a viver em grupo, mas sentem as consequências dessa aproximação. A mãe e a tia estão doentes, por isso não pudemos chegar perto delas.

“Essa situação de pós-contato é sempre muito complicada. Elas têm uma saúde muito frágil, falta de imunidade. Várias doenças que pra nós são simples, então, eles contraem uma série de resfriados diretamente. A gente diz que os dois primeiros anos são os dois primeiros anos mais vulneráveis no que diz respeito a questão da saúde”, diz Carlos Travassos, coordenador geral de índios isolados da Funai.

Na aldeia, Ihoro já encontrou um amor. Uma índia mais velha ensina ao rapaz os desafios que terá pela frente. Será que ele pensa em voltar a viver no meio da floresta?

“Acho que ainda é cedo para dizer. A gente tem a expectativa também que ele não venha pra cá de forma permanente, mas que ele possa optar, ter liberdade para optar o caminho que ele assim quiser”, diz Carlos Travassos.

Fonte: Fantástico

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