‘O que nós vamos comemorar?’, indaga liderança indígena sobre os 30 anos de demarcação das TI Yanomami

MANAUS — Pouco tem a celebrar o povo indígena Yanomami no dia em que a demarcação de suas terras completa 30 anos, nesta quarta-feira, 25. Ameaçados constantemente pela devastação da floresta e agora pela ação do garimpo ilegal, o povo originário luta para sobreviver e resistir na proteção da maior reserva indígena do País.

Maloca na Terra Indígena Yanomami. (Guilherme Gnipper Trevisan/Hutukara) Copyright © AGÊNCIA CENARIUM

São mais de 28 mil Yanomami, de, aproximadamente, 370 comunidades que lutam para proteger contra os 30 mil garimpeiros que atuam em atividades ilegais e que geram danos ao meio ambiente em uma área de 10 milhões de hectares localizada em uma região que engloba cinco municípios do Estado de Roraima e dois do Amazonas.

São constantes as denúncias de casos de agressão, mortes, conflitos e de violência sexual cometidos pelos garimpeiros contra o povo Yanomami. Não há o que se comemorar neste ano, garante o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Yek’wana (Condisi-YY), Junior Hekurari Yanomami.

“Estamos completando 30 anos de Terra Indígena (TI) Yanomami e o que nós vamos comemorar? Não há o que se comemorar. Não temos nenhuma proteção do governo federal na Terra Indígena Yanomami. Não tivemos nenhuma resposta do governo para ver a realidade dos brasileiros que estão sofrendo na Terra Indígena Yanomami. Queremos que esses garimpeiros sejam retirados urgente da terra indígena para a gente reorganizar as comunidades”, contou.

Caos Ambiental

O que se vê nos dias atuais se repetiu no ano do decreto da demarcação da terra indígena, em 1992, uma invasão de mais de 40 mil garimpeiros nas terras em uma corrida pelo ouro. No mesmo ano, o Brasil recebeu a conferência de meio ambiente das Nações Unidas, a Eco-92, e a concessão do direito exclusivo ao uso das Terras Yanomami fazia cumprir a Constituição Federal e era uma demonstração de força perante o mundo.

O relatório “Yanomami sob ataque”, divulgado pela Hutukara Associação Yanomami (HAY), relata que o garimpo ilegal avançou 46% na terra indígena, causando a maior devastação em 30 anos desde a demarcação das terras. A degradação, em 2021, foi de 3.272 hectares, contra os 2.234 de 2020. Dos 37 polos de saúde existentes na Terra Yanomami, 18 possuem registro de desmatamento relacionado ao garimpo.

Com artigos publicados recentemente pela revista científica Science, o biólogo Lucas Ferrante afirma que “é urgente que o governo brasileiro tire os invasores das Terras Indígenas Yanomami”, pois as mesmas “são cruciais para a conservação da Amazônia, da biodiversidade, dos serviços ecossistêmicos e esses povos precisam ser protegidos, pois eles são guardiões de uma parte fundamental para a conservação da Amazônia”, ressaltou.

Para o ambientalista Carlos Durigan, é “inaceitável” a ação que o povo originário vem sofrendo sem contar com o apoio do governo federal para reverter a situação atual. Durigan afirma ainda que os Yanomami enfrentam ameaças no “seu território, seu modo de viver e produzir” e fala da agravante que é o uso do mercúrio no uso do garimpo ilegal.

“O mercúrio ele tem poder de contaminação sistêmica, além de contaminar água, sedimentos, ele também entra na cadeia alimentar e o mercúrio acaba sendo uma fonte de contaminação nesses rios com dinâmicas alteradas e isso acaba contaminando as pessoas que consomem a água e peixes desses rios e igarapés e acaba gerando um problema gravíssimo para a população Yanomami”, explicou o ambientalista.

Festividade Yanomami

Uma celebração para marcar os 30 anos de demarcação da Terra Indígena Yanomami com participação de lideranças indígenas está sendo realizada desde domingo, 22, com previsão de término para esta quinta-feira, 26. Aproximadamente, 900 pessoas estão reunidas para celebrar a data na Comunidade Xihobi, no Amazonas, inclusive com a participação do ambientalista e líder indígena Ailton Krenak e do missionário Carlo Zacquini.

Fábio Leite – Da Revista Cenarium

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