STF: blindagem à vista para a “pauta verde”?

O aparato ambientalista-indigenista internacional está salivando com o julgamento da “pauta verde” pelo Supremo Tribunal Federal (STF), como está sendo chamado o conjunto de sete processos impetrados por partidos de esquerda (Rede, PV, PSB e outros) contra o governo federal, por alegada negligência na proteção do bioma Amazônia e descaso com os seus supostos impactos no clima global. O julgamento da pauta teve início na quarta-feira 31 de março, com a leitura do voto da ministra Cármen Lúcia sobre duas das ações, interrompida pela extensão do texto, prosseguindo em 6 de abril. A ministra é relatora de seis das sete ações, cabendo a restante à ministra Rosa Weber.

A expectativa da militância “verde-indígena” pode ser avaliada por uma nota da ONG Climainfo (31/03/2022), a qual ressalta que o julgamento “pode representar uma nova fase para a chamada litigância climática – ou seja, o uso do Judiciário pelos cidadãos para cobrar mais ação contra a mudança do clima por seus governos”, movimento que tem ganhado força em países como a Alemanha, Holanda Reino Unido e Austrália.

A nota cita o consultor jurídico do Instituto Socioambiental (ISA), Maurício Guetta: “No Brasil, é a primeira vez que o Supremo se debruçará em uma matéria de tanta relevância. E neste caso, por envolver a Amazônia, são ações que dizem respeito ao futuro da humanidade e dizem respeito a políticas públicas já existentes no nosso país. Em outros países, as políticas públicas tiveram de ser criadas a partir dessas decisões.”

Para o WWF-Brasil (30/03/2022): “A pauta é vista como uma sinalização de que ministros do STF estão dispostos a cobrar da Presidência da República medidas que deem uma resposta adequada aos graves problemas ambientais enfrentados pelo país – e que têm sido negligenciados pela atual gestão.”

Um artigo publicado no Valor Econômico de 30 de março (“O Supremo e a proteção climática e da Amazônia”) reforça a expectativa: “Nesse sentido, o conjunto de ações que o STF irá julgar pode representar uma resposta aos retrocessos em massa promovidos pelo Executivo neste último período, contribuindo para um processo de retomada do funcionamento regular dos órgãos de fiscalização, etapa importante para reverter a escalada no desmatamento no país.” Os quatro autores representam uma amostra representativa da crescente financeirização da agenda ambiental/climática: Ana Toni, diretora-executiva do Instituto Clima e Sociedade; Marcello Brito, empresário do agronegócio, ex-presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG); Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima; e José Pugas, sócio e head de ESG e Agronegócio da JGP Crédito.

E os anseios dos ambientalistas parecem confirmar-se. Apesar de Cármen Lúcia ter interrompido a leitura do seu voto, ela sinalizou uma apreciação favorável às demandas dos proponentes das ações, ao afirmar que admite a existência de um “estado de coisas inconstitucional em matéria ambiental no Brasil (Valor Econômico, 31/03/2022)”.

Na apresentação do relatório, na sessão da véspera, Cármen Lúcia já havia deixado clara a sua avaliação com termos fortes, ao afirmar:

Procede-se a uma destruição institucional pela cupinização silenciosa e invisível a olhos desatentos, quanto à dinâmica necessária de atuação democrática… Com relação ao meio ambiente, especificamente, as instituições são destruídas por dentro, como cupim, sem que se mostre exatamente o que se passa. Promovem-se políticas públicas ineficientes, ineficazes.

Na leitura do voto, ela reforçou:

Não é incomum, em matéria ambiental, que o Estado faça de conta que tem um aparato burocrático-administrativo e este fazer de conta é quase um teatro ambiental administrativo. Mantém-se uma estrutura que não funciona, ou seja, descumpre-se o dever constitucional do agir eficiente, que é obrigação estatal… A inércia, a atuação insuficiente, ou contrária aos deveres, macula de inconstitucionalidade a atuação do Estado, impondo-se a intervenção judicial para restabelecer a eficácia dos direitos à dignidade ambiental, aos direitos fundamentais dos indivíduos da presente e das futuras gerações.

Para a ministra, o governo federal promoveu uma redução da fiscalização, o abandono do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal, ausência da execução do orçamento destinado à área e enfraquecimento do quadro normativo.

Recorde-se que Cármen Lúcia e Rosa Weber estiveram na reunião fechada com o grupo de artistas que esteve em Brasília em 9 de março, para o “Ato da Terra”, manifestação contra o conjunto de projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional, visando à flexibilização da draconiana legislação ambiental e indígena brasileira (Alerta Científico e Ambiental, 10/03/2022).

A julgar pelas aparências, o aparato ambientalista-indigenista pode começar a celebrar.

P.S.: O julgamento da pauta foi adiado pelo pedido de vista do ministro André Mendonça, em 6 de abril, não havendo ainda uma data determinada para o reinício.

Posted by: Geraldo Luís Lino

PUBLICADO POR:    MSIA INFORMA 

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