“Guia de Seleção de Árvores Ornamentais: Paisagismo Urbano para a Amazônia”, disponível no portal do Museu Goeldi, destaca a importância do planejamento e aponta diferentes possibilidades para espaços urbanos na Amazônia brasileira. A obra também compartilha com o público a biografia de um grande especialista em Botânica amazônica falecido em 2024 – Nelson Rosa.

Agência Museu Goeldi – Qual a importância de uma adequada arborização para as pessoas e para as cidades? Tanto em uma grande metrópole ou em municípios com população menor, a arborização urbana ocupa um lugar significativo no que se refere à saúde e ao bem-estar da população, além de ser uma aliada no combate às mudanças climáticas. No entanto, recorrentemente, a presença das árvores é subestimada ou vista apenas como um detalhe estético no planejamento urbano.

Muito mais que sombras e paisagens, as árvores contribuem para a redução da temperatura nas cidades frequentemente afetadas pelo chamado “efeito ilha de calor”, um fenômeno causado, entre outros fatores, pelo excesso de concreto e asfalto que retêm calor. Além disso, as árvores melhoram a qualidade do ar, pois absorvem gases poluentes, como o dióxido de carbono (CO₂), e liberam oxigênio. Também atuam como filtros naturais, capturando partículas em suspensão, como poeira e fuligem, que podem causar problemas respiratórios.

Para que os benefícios da presença de árvores nas cidades, ou seja, da arborização em espaços urbanos sejam plenamente aproveitados, é necessário que ocorra um planejamento de forma criteriosa, desde a escolha das espécies e o plantio, considerando as mais adequadas para cada ambiente urbano.

Publicação – O Brasil, que abriga uma das maiores biodiversidades do planeta, apresenta desafios no que se refere à arborização urbana. Essa realidade ganha ainda mais destaque na Amazônia, onde a abundância de espécies nativas contrasta com a preferência histórica por plantas exóticas em áreas urbanas. Buscando alternativas a esse cenário, os pesquisadores Rafael P. Salomão e Nélson A. Rosa (in memoriam) apresentam o Guia de Seleção de Árvores Ornamentais: Paisagismo Urbano para a Amazônia, um manual técnico-científico que propõe diretrizes para a escolha e manejo adequado de espécies em espaços urbanos.

Disponível no portal do Museu Goeldi, o guia destaca a importância das árvores não apenas como elementos estéticos, mas como agentes que podem impulsionar a qualidade de vida nas cidades. Na Amazônia, onde altas temperaturas e umidade são constantes, a arborização urbana pode ser uma solução eficaz para atenuar o desconforto térmico, melhorar a qualidade do ar e promover o bem-estar das populações. Contudo, como apontado pelos autores, o planejamento adequado e o uso de espécies nativas são fundamentais para alcançar esses objetivos.

O guia apresenta uma matriz de seleção que analisa diversos atributos de espécies arbóreas, com destaque para características como altura da árvore adulta, forma da copa, floração, folhagem e valor cultural ou legal. Esses critérios ajudam gestores públicos, paisagistas e ambientalistas a tomar decisões informadas sobre quais árvores plantar em diferentes espaços urbanos.

Análise da Arborização Urbana em Belém

O pesquisador Rafael Salomão destaca que analisou a arborização na capital paraense qualitativa e quantitativamente, examinando, também, a legislação municipal sobre o tema. “Durante esse processo de análise, verificamos que é de 78 o número de espécies que foram usadas na arborização de Belém. Dessas, apenas 10 espécies correspondem a mais de 90% do total de árvores plantadas e apenas duas são originárias da Amazônia”, pontua.

O Manual de Orientação Técnica da Arborização Urbana de Belém, publicação de 2013 coordenada pela Prefeitura de Belém e Universidade Federal Rural da Amazônia, recomenda 85 espécies, das quais 46 são da Amazônia e 39 exóticas. Considerando que grande parte das cidades do interior do Estado tende a seguir os projetos paisagísticos da capital, segundo o pesquisador, pode-se considerar que a composição e a densidade não se distanciam destes números.

Rafael destaca, ainda, a matriz de seleção de espécies ornamentais para uso urbano, relacionando 151 espécies com uso atual e potencial no paisagismo urbano, das quais 89 são adequadas às vias urbanas e 54 às áreas verdes. Entre estas, 32 foram consideradas como de extrema beleza, 49 como muito belas e 70 como ornamentais. Espécies com flores perfumadas somaram 26, e outras 15 proporcionam sombra abundante.

Atributos – Dentre as características arbóreas que o guia destaca, está a altura. A altura de uma árvore é um fator determinante para seu uso em áreas urbanas, especialmente sob redes elétricas. O guia classifica as árvores em três categorias: pequenas (até 6 metros), médias (entre 6 e 12 metros) e grandes (acima de 12 metros). Para áreas sob fiação elétrica, recomenda-se espécies de menor porte, enquanto árvores de grande porte são ideais para parques e praças. Essa avaliação previne conflitos com a infraestrutura urbana e reduz custos com manutenção, como podas frequentes.

A forma copa das árvores é fundamental por proporcionar sombra e conforto térmico, especialmente em regiões de altas temperaturas. O guia destaca tipos de copa, como as densas e largas, que oferecem excelente cobertura, e as ralas e estreitas, mais adequadas para espaços menores. Exemplos práticos incluem copas esféricas, como a do oitizeiro  (Licania tomentosa), e copas em forma de guarda-chuva, como a do visgueiro (Parkia pendula).

Além disso, as flores são um dos principais atrativos ornamentais das árvores. O manual valoriza espécies com florações vistosas, como o ipê amarelo (Handroanthus serratifolius) e o ipê roxo (Handroanthus impetiginosus), reconhecidos pela exuberância de suas cores. Apesar de muitas flores terem curta duração, seu impacto visual e ecológico, ao atrair polinizadores, as torna elementos essenciais no paisagismo urbano.

Por fim, o guia também destaca que muitas árvores têm importância cultural e legal, sendo símbolos de identidade local. O guia ressalta espécies como as mangueiras (Mangifera indica), indissociáveis da paisagem de Belém, conhecida como “Cidade das Mangueiras”. Além disso, algumas espécies, como o pau-brasil (Caesalpinia echinata) e a castanheira-do-brasil (Bertholletia excelsa), são protegidas por leis devido à sua relevância histórica, econômica e ambiental.

Plantas para Belém – Os assuntos do Guia são relevantes para o debate sobre o processo de arborização na capital paraense e foram tópicos do evento “Plantas para Belém: estratégias para a arborização e jardinagem de Belém frente aos desafios urbanos e climáticos”, realizado em novembro de 2024, no Auditório Paulo Cavalcante – Campus de Pesquisa do Museu Goeldi, como resultado do acordo de cooperação técnica com a Prefeitura de Belém sobre a educação ambiental e arborização da cidade. No decorrer do evento, os presentes participaram de palestras e dinâmicas de grupo com temáticas referentes à estrutura urbana de Belém; vulnerabilidades urbanas frente às mudanças climáticas; resiliência, sustentabilidade e conservação ambiental a favor da inclusão; e aproveitamento de espécies nativas da região amazônica.

A Coordenadora de Pesquisa e Pós-Graduação do Museu Goeldi, Marlúcia Martins, destacou a importância do debate e a busca de um consenso sobre espécies adequadas em função das características específicas de Belém.

O professor Sérgio Brazão, da Universidade Federal Rural da Amazônia, enfatiza a importância de uma abordagem técnica para a arborização urbana em Belém, considerando as especificidades geográficas da cidade. Durante a oficina, Brazão ressaltou que, por ser uma cidade plana, mas com áreas de baixa altitude e subsolos ricos em água, é essencial escolher espécies adaptadas a essas condições para garantir a sobrevivência das árvores. Ele também enfatizou a necessidade de selecionar espécies adequadas para as áreas de terra firme, visando criar uma arborização que reflita a identidade amazônica.

Na construção de uma cidade resiliente às mudanças climáticas, Marlúcia Martins destaca que a arborização urbana deve ser planejada como parte integrante da infraestrutura da cidade, contribuindo para a contenção do solo, amenização de temperaturas, absorção de carbono e manutenção da fauna, como polinizadores e aves. Além disso, a distribuição equitativa de áreas verdes no espaço urbano é essencial para garantir benefícios socioambientais em todas as regiões da cidade, promovendo maior justiça climática.

Texto: Marcelo Dias / Edição: Joice Santos / Manual técnico-científico propõe soluções para a arborização urbana na Amazônia — Museu Paraense Emílio Goeldi