A Primeira Ponte Bailey do Amazonas

Mais uma vez tenho a honra e o privilégio de apresentar aos nossos caros leitores um artigo de um grande amigo da arma de Engenharia do Exército Brasileiro. Sempre o considerei um soldado e um cidadão modelar com que tive a satisfação de ombrear e que, como poucos, serve de inspiração aos guerreiros mais jovens deste nosso querido país.

6° BEC e Ponte Bailey.

Primeira Ponte Bailey Construída Pelo 6° BEC
Estado Do Amazonas – Dezembro 1978
(Construída Pelo 1° Ten Eng Celso Jaloto Avila Junior – Igarapé das Lages – Km 113 da Br-174)

  1. Antecedentes Históricos

Entre 1968 e 1974, no governo do Gen Emílio Garrastazu Médici, o Brasil teve um crescimento vertiginoso, se tornando a oitava maior economia do mundo, com isso esse período ficou conhecido como o “milagre brasileiro”. Diversas foram as iniciativas nas áreas econômica e social, entre elas o “Programa de Integração Nacional” (PIN), criado em 1970, que previa a construção de inúmeras rodovias na região amazônica. Entre elas, a Transamazônica (BR 230), Cuiabá-Santarém (BR 163), Manaus-Porto Velho (BR 364) e Manaus a Boa Vista (BR 174). O Cel Mário Andreazza como Ministro dos Transportes (1967-1974), estava à frente dessa integração rodoviária da Amazônia.

Tal processo foi planejado para dar respaldo à ocupação econômica da Amazônia e integrá-la ao contexto nacional e internacional. Naquela época, o slogan era “Integrar para não Entregar” e dentro deste conceito, o Gen Médici convidava “os homens sem-terra do Brasil a ocuparem as terras sem homens da Amazônia”. Logo que a BR-174 foi inaugurada muitas famílias começaram a ocuparem terras sob o controle e distribuição do INCRA. Para apoiar estas famílias, a 1ª Cia Eng Cnst do 6° BEC, sediada no Abonari, tinha um posto médico, com respaldo do FUNRURAL, e estava estruturada com médicos, dentistas e enfermeiros para dar o pronto atendimentos aos assentados nos lotes pioneiros de ocupação. Para isso, tinha um ônibus com uma enfermaria móvel, que periodicamente percorria a rodovia em pontos já pré-definidos.

O primeiro Batalhão de Engenharia a ser designado para a Amazônia foi o 5° BEC, que foi transferido em 1966 para Porto Velho-RO, com a missão de fazer a manutenção da rodovia Cuiabá a Porto Velho e iniciar as obras de construção da Cuiabá – Rio Branco – Cruzeiro do Sul, concluindo a BR-364.

O 6° Batalhão de Engenharia de Construção (6° BEC), em 1969, seguiu de Manaus para ocupar suas instalações em Boa Vista-RR. Sua missão principal seria a construção da BR-174, que ligaria Manaus a Boa Vista e posteriormente, daí seguiria rumo a fronteira da Venezuela ligando o “Marco BV-8”, como era conhecido na época, pois somente em 1995 a Vila de Pacaraima-RR foi criada como município. Como missão secundária coube também ao 6° BEC, a construção da BR-401, que ligaria Boa Vista as cidades de Bonfim e depois Normandia, ambas na fronteira com a Guiana.

Mapa de Roraima

A obra foi iniciada em 1970, mediante um convênio assinado entre o Ministério do Exército e o então “Departamento Nacional de Estradas de Rodagem” (DNER). O 6° BEC, em 1971, ao dar início as atividades, criou duas frentes de trabalhos, que foram organizadas para que pudesse dar início às obras da BR-174.

O Destacamento Sul, sairia do Igarapé Tarumãnzinho, Km 45, vindo de Manaus, onde a rodovia estava paralisada e seguiria, em linha reta até Boa Vista. O Destacamento Norte, sairia de Vista Alegre, na margem esquerda do Rio Branco próximo de Caracaraí-RR, em linha reta até Manaus.

Entretanto, esta linha reta não foi totalmente obedecida. A seção técnica do 6° BEC, após fazer um reconhecimento detalhado, decidiu por mudar o traçado planejado. Ou seja, seguindo para o norte, do Posto Jundiá, hoje Vila Jundiá, a linha reta que deveria atingir Caracaraí, foi desviada para direita, pois o trecho entre o Rio Anauá e o Rio Branquinho possuía uma região muito alagadiça e com material para a infraestrutura da estrada, de baixa qualidade. Portanto, a decisão foi a de aproveitar um trecho da BR-210, que já estava sendo construída pela Construtora Paranapanema e fazer esse desvio. Naquela época, chegou a se comentar que as duas frentes se perderam em seus traçados e não se encontraram, tendo que fazer esse desvio. Porém, a verdade não foi essa e sim foi uma decisão de caráter técnico e econômico, abreviando o término da construção da BR-174. Em abril de 1977 foi inaugurada essa importante rodovia, após finalizarem todas as obras de terraplanagem que permitiu a ligação, por terra, do então Território Federal de Roraima ao restante do Brasil.

Além do convênio do DNER com o Ministério do Exército, foi necessário o envolvimento da “Fundação Nacional do Índio” (FUNAI), com o estabelecimento de “Frentes de Atração”, pois o traçado da BR-174 cruzava a reserva indígena da etnia “Waimiri-Atroari”, pertencente ao tronco linguístico “Karib”. Naquela época, existia um posto da FUNAI, próximo ao cruzamento do Igarapé Santo Antônio do Abonari, Km 208 cerca de 8Km da sede da 1ª Cia Eng Cnst. O outro posto ficava próximo ao Posto Jundiá, hoje Vila Jundiá, Km 327 da BR-174. Ou seja, divisa Sul e divisa Norte desta reserva indígena.

O atual Estado de Roraima, situado em uma região periférica da “Amazônia Legal”, no noroeste da Região Norte do Brasil, predomina a floresta amazônica, havendo ainda uma enorme faixa de savana no centro-leste. Encravado no Planalto das Guianas, uma parte ao sul pertence à planície Amazônica, atravessada pelo Rio Branco, que nasce nos contra fortes da Serra Pacaraima. É cortada pela BR-174, ligando Manaus até a fronteira com a Venezuela. Roraima possui basicamente dois ecossistemas. O primeiro, ocupando 17% de sua área (40 mil Km2), conhecido por savana, cerrado ou lavrado, formado por gramíneas. O segundo correspondendo a 83%, com cobertura vegetal tipo floresta tropical úmida.

O 6° Batalhão de Engenharia de Construção (6° BEC), é uma unidade operacional da Arma de Engenharia atuando na área do Comando Militar da Amazônia (CMA), subordinada diretamente ao 2° Grupamento Engenharia (2° Gpt E), com sede em Manaus – AM. Ele tem como atribuição, contribuir com a missão do 2° Gpt E, prestar o apoio de Engenharia às Grandes Unidades e Unidades subordinadas ao CMA e, subsidiariamente, cooperar com o desenvolvimento nacional e com a Defesa Civil na execução de obras e serviços de engenharia.

  1. Ano 1978 – Minha Transferência Para o 6° BEC

Eu Celso Jaloto Avila Junior, paulista de Santo Anastácio-SP, fui declarado Aspirante de Engenharia, em 12/Dez/1975, por término de conclusão de curso, na Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN) e designado para servir no 6° Batalhão de Engenharia de Combate (6° BECmb), em São Gabriel-RS.

Alguns meses antes da minha promoção a 1° Ten, em dezembro de 1977, me voluntariei a servir em uma OM da Amazônia. Portanto, em 17/Abr/1978 fui transferido para o 6° Batalhão de Engenharia de Construção (6° BEC), com sede em Boa Vista-RR, tendo me apresentado pronto para o serviço no dia 05/Jun/1978. Comandava o Batalhão, o Ten Cel Luís Antônio Rodrigues MENDES Ribeiro.

Para um Tenente era um sonho que se realizava, pois a Amazônia sempre despertava o imaginário de qualquer jovem militar da Arma de Engenharia, desde os bancos escolares da AMAN. Meu tempo de permanência na sede do Batalhão foi pequeno, pois apenas quatro dias depois da minha apresentação, pronto para o serviço, eu já estava designado para comandar um pelotão da 1ª Cia Eng Cnst, com sede em Abonarí, cerca de 550 Km em direção a Manaus-AM.

Portanto, segui para o Abonari no dia 09 de Junho, uma sexta-feira. Eu estava acompanhado de minha esposa, uma vez que havíamos nos casado apenas seis meses antes. Lembrando que naquela época, a estrada era toda de terra, pois havia sido inaugurada há apenas um ano antes da minha chegada no 6° BEC. Saímos na madrugada daquele dia e chegamos no Abonari ao anoitecer daquele dia. Era o Comandante da Companhia, o Cap Genino Jorge COSENDEY, mas que naquele mês ele estava de férias e eu assumi o comando da Companhia. A 1ª Cia Eng Cnst era responsável por praticamente 420 quilômetros, de Manaus até o Rio Jauaperi. De Manaus até o Jauaperí ficava assim distribuída

1)  Km 122, Residência de Construção de Santa Cruz, sede de um Pelotão. Próximo as instalações havia um campo de pouso, de avião de pequeno porte, localizado ao longo da estrada;

2)  Km 208, Abonarí sede da 1ª Cia E Cnst e posto de controle da entrada (limite sul) da reserva indígena “Waimiri-Atroari”. Próximo as instalações da Cia havia um campo de pouso, de avião de pequeno porte, localizado ao longo da estrada;

3)  Km 254, Rio Alalaú, divisa do Estado do Amazonas com o Estado de Roraima, existia um Posto com três a quatro militares para operarem a balsa do Rio Alalaú;

4)  Km 327, Posto do Jundiá com um pequeno grupamento para controle do tráfego, pois era a saída(limite norte) da reserva indígena;

5)  Km 419, Rio Jauaperí, existia um Posto com três a quatro militares para operarem a balsa do Rio Jauaperí.

Basicamente as missões da 1ª Cia Eng Cnst eram as de:

1)  Manter a trafegabilidade da BR-174, de Manaus ao Rio Jauaperí;

2)  Manutenção dos bueiros de tubos Armco existentes neste trecho;

3)  Manutenção de todas as pontes existentes neste trecho e que ainda eram todas de madeira;

4)  Manutenção e operação das Balsas dos Rios Alalaú e Jauaperi;

5)  Controle da entrada e saída na reserva indígena “Waimiri Atroari” e orientação para sua travessia;

6)  Manter as instalações da sede da Companhia, Pelotão de Santa Cruz e Postos distribuídos;

7)  Manutenção de todas as viaturas e equipamentos de engenharia em atividade no trecho;

8)  Manter as atividades de suprimento e logística do pessoal empregado no trecho;

9)  Realizar o apoio de saúde para a população assentada nos lotes distribuídos pelo INCRA, no trecho;

10) Manter diariamente o contato rádio com a sede do 6°BEC, principalmente informando a situação dos índios “Waimiri Atroari” e seus movimentos na reserva, caso existisse alguma ação agressiva. Essa atividade era obrigatória e virou rotina, que ficou conhecida como “rádio do índio”.

Nossa atividade era enorme face ao pequeno efetivo do pessoal militar e civil lotado na 1ª Cia Eng Cnst e a grande extensão sob nossa responsabilidade.

Além disso, o índice pluviométrico na região, trazia enormes danos em todo trecho da estrada. Além disso, tínhamos que conviver com a malária e a leishmaniose que era uma realidade entre todo o pessoal que estava diuturnamente expostos aos vetores destas doenças.

  1. Chegada da Equipagem de Ponte Bailey

Eu havia sido designado para servir na 1ª Cia Eng Cnst, no Abonari, e havia chegado na noite de sexta-feira de 09/Jun/1978. Já na segunda-feira, dia 12 de junho, o S/3 do 6° BEC chamou-me no rádio e verbalmente transmitiu as ordens do Ten Cel Mendes, Cmt do 6° BEC.

6° BEC junho de 78

Ele determinava que eu fosse a Manaus, para receber uma equipagem de Ponte Bailey que estava sendo transferida do 5° BEC (Porto Velho-RO) para o 6° BEC (Boa Vista-RR). Informou-me que o 2° Gpt E Cnst, havia feito uma licitação para o carregamento e transporte de toda a equipagem, que havia chegado no porto de Manaus. Minha missão era a de conferir todo o material desembarcado no porto, orientar o carregamento dos estivadores contratados, nos caminhões civis e em comboio trazer a equipagem para os depósitos da 1ª Cia Eng Cnst, no Abonari e ali permanecer, para quando necessário pudesse ser empregada na BR-174.

O dia exato não me recordo, mas foi naquela semana de 12 a 16 de junho de 1978. Chegando no porto de Manaus, um militar do 2° Gpt E Cnst me aguardava para providenciarmos a conferência do material e depois a orientação de como fazer o manuseio, carregamento e transporte das peças da equipagem Bailey, havia ficado sob minha responsabilidade. Imaginem que a viatura que foi utilizada para o transporte, não era militar e muito menos adaptada ao transporte do material pesado de uma equipagem Bailey. Os motoristas quase desistiram do transporte, pois estavam preocupados em danificar as carrocerias de seus caminhões.

Os caminhões usados e comum na época, eram Mercedes Benz, modelo 1519, com capacidades de carga para 15 toneladas e se tivessem um terceiro eixo poderiam transportar até 22 toneladas. O passo seguinte foi o de orientar os civis, estivadores, de como fazer o transporte das peças e como carrega-las sem ter acidentes na operação. Mas, tudo correu bem, não houve acidentes e as viaturas seguiram em comboio juntamente comigo e a equipagem finalmente foi descarregada nos depósitos do Abonari, 208 Km de Manaus

  1. A Ponte Bailey

A Ponte Bailey é uma ponte de aço modular, que foi desenvolvida entre 1940-1941, por “Donald Bailey”, um funcionário do Gabinete de Guerra inglês, cuja finalidade militar era para ser usada durante a 2ª Guerra Mundial. Inicialmente foi usada por unidades de Engenharia Militar inglesas, americanas e canadenses. Após a grande guerra, em virtude da sua facilidade e velocidade de montagem, mobilidade e versatilidade, foi amplamente difundida entre outros exércitos, além de empresas civis de todo o mundo.

Esta ponte não exige ferramentas especiais ou equipamentos pesados para sua montagem. É uma ponte em treliça pré-fabricada e portátil, de fácil manuseio à mão e que depois de montada, dependendo dos formatos utilizados, tem uma capacidade excelente de resistência a carga, sobre elas.

O Marechal de Campo, inglês, Montgomery, fazendo uma alusão da importância desta ponte em operações militares da 2ªGM, fez esse comentário: “Eu nunca poderia ter mantido a velocidade e o ritmo do avanço de ataque sem um grande suprimento de pontes Bailey”.

A estrutura é montada sobre roletes de aço em uma das margens e empurrada manualmente para a margem oposta. As seções das pontes são montadas sucessivamente com o posicionamento dos painéis, colocação das vigas transversais e instalação dos contraventamentos horizontais e verticais. Após o assentamento da ponte nos apoios feito com o auxílio de macacos hidráulicos, é colocado o piso e são montadas as rampas de acesso.

No Brasil, vivenciamos os mais diversos problemas no sistema de transportes rodoviário. Parte pela falta de manutenção das rodovias e obras de artes e parte por problemas agravados com período intenso de chuvas. Em vista disso, periodicamente estamos nos deparando com a falta de acesso às localidades ou mesmo a interrupção de tráfego de rodovias importantes. Portanto, essa é uma ponte que o Exército tem construído em todo o Brasil, para atender a demanda da Defesa Civil.

  1. Primeiro Lançamento da Ponte Bailey, na Região Amazônica

Para mim, foi uma honra poder ter sido o primeiro oficial de Engenharia do Exército Brasileiro a lançar uma Ponte Bailey, ao norte do Rio Amazonas. O mais interessante é que participei do recebimento da equipagem desta ponte, que o 6° BEC havia recebido e praticamente seis meses após eu também recebi a missão de montá-la, pois a necessidade de seu emprego surgiu em dezembro daquele mesmo ano de 1978.

BR-174

Naquela época, não havia percebido a importância daquela missão, pois eu a cumpri como mais uma das diversas missões que um Tenente de Engenharia podia receber, quando em atividade em uma frente pioneira e responsável pela manutenção de uma rodovia, como o da BR-174. Só fui me dar conta disso, quando no momento de minha despedida, quase dois anos depois, por transferência para outra Unidade Militar. Eu estava no gabinete do Comandante do 6° BEC, quando foi lido um elogio pelos meus trabalhos desenvolvidos no Batalhão e naquele momento, entre outras menções elogiosas, foi citado com louvor essa missão desempenhada, na construção desta ponte Bailey. Faço questão de aqui reproduzir o extrato de um trecho do referido elogio. Ele foi publicado no dia 12/Junho/1980, no Boletim Interno N° 107, do 6° BEC, quando o Comandante era o Ten Cel Jorge FEIJÓ:

[…] Vindo de um B E Cmb aqui apresentou há exatamente dois anos atrás, sendo designado para chefiar uma Residência de construção da 1ª Cia E Cnst, encarregada da conserva de cerca de trezentos quilômetros da BR-174, MANAUS-FRONTEIRA DA VEZENUELA. Durante todo o seu tempo de serviço no Batalhão, permaneceu destacado em plena floresta amazônica, longe dos confortos que cercam uma cidade, procurando vencer os difíceis obstáculos que essa missão apresenta, de modo a manter em condições de tráfego, esta importante rodovia federal. Na 1ª Cia, ainda como Chefe de Residência, comandou a construção da primeira ponte de painéis BAILEY, construída pelo 6° BEC para restabelecer o tráfego da rodovia, por ocasião da queda da ponte de madeira sobre o Igarapé das Lajes e, ainda, por diversas vezes assumiu o Comando da Cia, dando esse Oficial o melhor de seus esforços e uma prova de sua capacidade, executando com êxito as missões que lhe foram confiadas. […]

A ponte de madeira sobre o Igarapé das Lages, estava localizada no Km 113 da BR-174. Naquela época, ela possuía quarenta e dois (42) metros de comprimento. O seu leito de rodagem se deteriorou e abriu vários buracos no seu piso, trazendo um comprometimento significativo para o seu uso com segurança. Como não havia tempo hábil para ser feito uma perfeita manutenção na sua infraestrutura, que já estava danificada pelo uso, ocasionando dias de interrupção do tráfego, a decisão foi a de construir um pontilhão provisório de madeira, a cavaleiro da ponte sobre o Igarapé das Lages e interromper o uso da ponte. Com isso, o tráfego passou a ser feito através deste pontilhão. Entretanto, estávamos em um período de fortes chuvas e após algumas semanas o pontilhão ruiu, forçado pelo volume de água que desceu a montante do pontilhão, acabando por deslocar o madeiramento, deixando novamente o trecho interditado.

Mapa Rodoviário

A BR-174 foi interrompida, no dia 12/Dez/1978. A decisão tomada foi a de lançar, sobre o pontilhão demolido, uma ponte Bailey de painéis, tipo “Dupla-Simples”, restabelecer o tráfego e após isso, podermos ter tempo suficiente para fazermos uma manutenção detalhada da infraestrutura original que estava bastante deteriorada.

Veja a seguir, a imagem de um recorte do “Jornal do Comércio”, de Manaus-AM, de 16/Dez/1978, onde foi publicado um AVISO feito pelo 2° Gpt E Cnst, através do Ten Cel Lauro Augusto Andrade PASTOR Almeida, alertando da interrupção da BR-174, no Km 113, Igarapé das Lages. Naquela época, o Comandante do 2° GEC era o Gen Bda Dalnio Teixeira STARLING.

Jornal do Comércio

Todo oficial de Engenharia, sabe muito bem que para montar uma ponte “Simples-Simples”, é necessário o emprego mínimo de 33 militares (01 Pelotão), treinados para essa montagem. No nosso caso a montagem planejada e executada, foi de uma “Dupla-Simples”. Porém, estávamos no meio da selva e distantes 645 quilômetros de Boa Vista-RR, sede do 6° BEC e o movimento de caminhões aumentava.

Não possuíamos esse efetivo de soldados, pois nosso efetivo militar estava todo ele distribuído pelo trecho, na área de atuação da 1ª Cia E Cnst. Além disso, nem conheciam o que era uma Ponte Bailey, muito menos tinham prática de montagem. A solução, foi reunir os soldados que possuíamos e trazermos alguns funcionários civis que trabalhavam conosco na 1ª Cia e estavam próximos do Km 113 (Igarapé das Lages). Neste momento, a vontade de aprender e o sentimento do cumprimento da missão falou mais alto e passamos rapidamente a formar as equipes de montagem, ensinando-os como transportar e como fazer as montagem. Realmente foi como uma conduta de combate.

Eu como 1° Ten Eng chefiava o destacamento. Como graduados eu tinha um 1° Sgt Eng, mineiro que havia servido na Escola de Sargentos das Armas (EsSA), em Três Corações-MG, que infelizmente não consigo lembrar o nome deste eficiente Sargento, que na Foto n°13, ele está a minha esquerda. Tinha o 2° Sgt Eng Renato, gaúcho e o Cabo Paiva, um carioca que estava no Batalhão há muito tempo e que nesta mesma Foto n°13, aparece encostado em um dos painéis da ponte, a minha retaguarda. Os soldados que compunham o destacamento eram em número de vinte oito (28).

A outra dificuldade surgida foi quanto ao manual de instrução para os cálculos necessários para execução do lançamento, posicionamento dos roletes de lançamento, montagem do nariz de lançamento, dos painéis, etc… Quem aprende uma vez a montagem de uma ponte Bailey, jamais esquece. Entretanto para os cálculos básicos e as distâncias corretas, não tínhamos o “Manual Técnico: Ponte de Painéis Tipo Bailey, M2” – (T 5-277, 1ª edição, 1976). Encontramos sim o conhecido de todos, o “Vade-Mécum de Engenharia” – (C-5-34, 1ª edição, 1960), que nos deu um norte para os nossos trabalhos.

Figura Esquemática

As fotos da Ponte Bailey sobre o Igarapé das Lages, aqui apresentadas, falam por si só. Foi realmente como uma missão de combate, pois com pouca mão de obra e sem conhecimento algum, a missão foi cumprida e o tráfego restabelecido. Não estavam todos uniformizados como um grupamento militar constituído, mas os militares e civis envolvidos assumiram a responsabilidade para o cumprimento da missão e todos, no dia seguinte seguiram para mais uma jornada de trabalho, onde o objetivo diuturno era o de manter a BR-174 com trafegabilidade.

REPERTÓRIO FOTOGRÁFICO

 

O Trecho da Canção do 6° BEC, sintetiza o ideal de conduta e trabalho pioneiro da nossa Engenharia e de todos que ombreiam juntos no cumprimento de suas missões ”Sempre há um soldado engenheiro nas origens de toda a vitória”.

  1. Conclusão

É a primeira vez que escrevo e faço esse relato, bem como é a primeira vez que estas fotos são mostradas, pois fui buscar no meu arquivo de fotos do período em que servi no 6° BEC e por dois anos (1978 a 1980) fiquei destacado, juntamente com minha esposa, no interior da selva amazônica, na região de Santa Cruz (Km 122 da BR-174) e no Abonari (Km 208 da BR-174). Um período onde tudo era distante e difícil, pois a energia elétrica era através de geradores, acionados em espaços curtos de tempo. Não existia telefonia, não tínhamos sinal de TV, não havia água tratada e toda a BR-174 era com pavimento de terra. Porém, havia uma solidariedade muito grande entre todos os militares e civis que lá atuavam, destacados longe da sede do Batalhão.

Naquele período fui Comandante do 1° e 2° Pel e depois também da 1ª Cia E Cnst em várias oportunidades. Com a saída do Cap COSENDEY do Cmdo da 1ª Cia, assumi temporariamente. No ano de 1979 novo Cmt Cia assumiu a função. Foi o Cap Godofredo Jesus CORREA, que nos anos de 1990 a 1993 como Ten Cel foi o Cmt do 12° BECmb (Alegrete-RS) e posteriormente foi promovido a Gen Bda. No 6° BEC, quando cheguei, em Junho 1978, o Comandante era o Ten Cel MENDES e quando fui transferido, em Junho 1980, era o Ten Cel Jorge FEIJÓ.

Repito, com muito orgulho fui o primeiro oficial de Engenharia do 6° BEC, a construir a primeira ponte Bailey ao norte do Rio Amazonas. Portanto, com esse meu breve relato, espero ter contribuído para o resgate de uma pequena parcela da história do 6° BEC, naquela missão de dezembro de 1978. Neste ano, no dia 26 de julho de 2022, o 6° BEC comemorou no 2° GEC, em Manaus, os 45 anos da implantação da BR-174. Com certeza, foram reverenciados todos aqueles que passaram pelo 6° BEC e deram seu suor e alguns até o seu sangue e que todos eles possam ter a certeza que “não viveram em vão”.

Hoje, na reserva, apesar dos meus setenta anos (70), continuo contribuindo por um Brasil melhor, pois juntamente com minha esposa administramos um fazenda em São Gabriel-RS, produzindo alimentos, plantando soja e trabalhando com pecuária na criação de genética de gado de corte, da raça Braford.

Lembremos um trecho da nossa Canção da Engenharia que sempre nos estimulará a servir o Brasil:

Nobre e indômita, heroica e secular
Audaz, na guerra, ao enfrentar a morte
Na paz, luta e trabalha, sem cessar
Pioneira brava de um Brasil mais forte

Celso JALOTO Avila Junior – Cel Eng Veterano.

Selva!!!!

São Gabriel-RS, 31/Julho/2022.

CONTATOS:

Para quem tiver interesse em fazer contato comigo, estou à disposição para qualquer outras informações sobre o período em que estive de 1978 a 1980, no Abonari (Km 208) e Santa Cruz (Km 113) da BR-174.

Celso Jaloto Avila  Junior
Whatsapp: (55) 99954-40.30
Email: cjaloto@terra.com.br
São Gabriel-RS

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 09.08.2022 –  um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;   

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: hiramrsilva@gmail.com.

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