A Terceira Margem – Parte CDXIX

Descendo o Rio Branco

O Canoeiro Hiram Reis e Silva

Homenagem Especial
Manoel da G. Lobo de Almada (1787)

 Nasceu, em 1745, na Quinta de Santo Antonio da Urmeira, entre Odivelas e Pontinha, na Grande Lisboa em Portugal. Foi batizado em 06.02.1745. Nunca foi, como afirmado por muitos, um Engenheiro Militar, embora tenha sido quem assinou os mapas de reconhecimentos por ele realizados. Na idade adulta tinha 1,73 m de altura, cabelos castanhos escuros e olhos azuis.

Manoel da G. Lobo de Almada (1787)

Jurou Bandeira em 14.02.1764, com 19 anos, no 1° Regimento da Armada, Unidade que fornecia militares de Infantaria para os navios da Marinha. Com formação Marinheira foi destinado à Companhia de granadeiros, que era a tropa naval de elite, com o título nobiliárquico de Cadete. Passou a navegar em missões de Guarda ‒ Costeira, tendo sido elogiado por seu comandante pelo interesse e conhecimentos que revelava nas lições de pilotagem, mesmo não sendo esse o seu direcionamento, pois era da infantaria naval.

Preso por conflito com civis, foi destinado a servir em Mazagão, no Marrocos, onde fora por comutação de pena emanada de ordem real. Nomeado Ajudante das Suas Ordens pelo Capitão-General e Governador do Mazagão, Dinis Gregório de Melo e Castro Mendonça, sobrinho dos irmãos Sebastião José de Carvalho e Melo [Conde de Oeiras, depois Marquês de Pombal], Francisco Xavier de Mendonça Furtado [Secretário da Marinha e Domínios Ultramarinos] e Paulo de Carvalho e Mendonça [Comissário da Bula da Cruzada].

Ganhara, também, o respeito e a veneração dos experimentados guerreiros da guarnição e seus familiares com os quais partiu para Lisboa em 11.03.1769, data do abandono da Praça. Nessa capital, em 01.04.1769, recolheu-se à sua Companhia no 1° Regimento da Armada.

Em 5 de setembro desse ano foi promovido a Sargento-Mor [hoje posto de Major] de Infantaria de Marinha e nomeado Governador da Praça de São José de Macapá. Ainda nesse ano, em 15 de setembro, partiu para Belém, comandando o mais rápido dos 10 navios [e não 3 como se tem escrito], que de forma forçada transportaram os manzaganistas para aquela cidade, a fim de fundarem uma Vila na margem Norte do Amazonas.

Em Macapá teve grave e melindrosa desavença resultante de problemas de jurisdição com o Sargento-mor engenheiro Gronfeld que dirigia as obras da Fortaleza. Apesar da rixa com o alemão e ainda devido a seu heroísmo em Mazagão, foi promovido a Tenente-Coronel da Infantaria Naval.

Em virtude de problemas previstos por Mendonça Furtado em Vila Nova Mazagão entre os deslocados do Marrocos e o comandante militar, Capitão-General e Governador do Pará, Fernando da Costa de Ataíde Queive, lembrando-se da sugestão do tio, enviou Lobo de Almada a pacificá-los e apoiá-los na instalação e início das atividades agrícolas, o que fez com grande êxito e satisfação geral.

A partir daí, sob as ordens do novo Capitão-General e Governador do Pará, João Pereira Caldas, antigo ajudante de ordens do Almirante Mendonça Furtado ex-governador do Piauí por 10 anos, que posse em final de 1772, iniciou uma fabulosa carreira amazônica, podendo ser levantados seguintes tópicos:

–  Governador da Praça de Macapá por 11 anos;
–  Desenvolveu a criação de gado e a produção do arroz, do anil, e do algodão nas Vilas de Macapá, Vistosa e Nova Mazagão que passaram por grande surto de progresso sob sua administração;
–  Disciplinou e instruiu a tropa de linha para evitar os ataques dos franceses;
–  Em março de 1780, assume o novo Governador do Pará, o Capitão-General José de Nápoles Telo de Meneses que propôs a promoção a Coronel de Lobo de Almada;
–  Como as demarcações de limites não iam bem, o Secretário de Estado da Marinha e do Ultramar, Martinho de Melo e Castro, decide lançar mão de Lobo de Almada, em termos que eram uma crítica, a Pereira Caldas e seus técnicos:
–  Foi-lhe atribuído o Comandamento do Alto Rio Negro onde se situavam os Fortes de São José das Marabitanas e São Gabriel da Cachoeira com a missão de reconhecer as 5 ou mais ligações que se dizia existir entre os Rios Negro e Japurá.

Em 25.08.1786, foi nomeado Governador da Capitânia de São José do rio Negro. Antes que chegassem os documentos para a tomada de posse, foi cumprir a missão de reconhecer o Rio Branco, pois, segundo o Secretário de Estado da Marinha e Ultramar, Martinho de Melo e Castro:

ninguém poderá desempenhar melhor uma comissão de tanta importância. 

Nesse trabalho foi vítima de um naufrágio que o lançou contra as pedras de uma cachoeira. Só foi salvo pela intervenção de 2 soldados, ficando com o corpo todo ferido de escoriações e contusões. Pereira Caldas temendo continuasse a exploração sem ter sarado as feridas e convalescido, permitiu-lhe e aconselhou-o a regressar a Barcelos, sendo a diligência concluída pelos engenheiros que o acompanhavam.

E como o Coronel tivesse optado por continuar, ainda lhe escreveu:

Uma vez que V.S.ª, com a sua costumada honra e constância, se dispunha de prosseguir pessoalmente nas diligências que lhe são confiadas, só me resta o desejo de que, por ir pouco convalescido dos passados trabalhos, lhe não sobrevenha algum maior e mais funesto incômodo. […]  

Em 25.11.1788, foi nomeado para substituir João Pereira Caldas como Encarregado da Demarcação das Fronteiras. Nessa situação decidiu dar fim aos abusos do Comissário Espanhol Francisco Requena que há anos residia na Vila nomeada de Tefé pela Partida [Representação] castelhana e da Ega pela Partida portuguesa. Sabia que expulsá-lo significaria reação de Requena ao regressar ao território espanhol. Para impedir essa retaliação Lobo de Almada determinou aos Representantes Portugueses que mudassem a sede de seus trabalhos para Tabatinga e impedissem o regresso dos vizinhos a Ega [Tefé]. Com essa decisão de alto risco, da sua exclusiva iniciativa deu ao Brasil a imensa faixa territorial que vai da hoje cidade de Tefé até a cidade de Tabatinga. Com sua habitual persistência e espírito progressista operou grande desenvolvimento na Capitania de São José do Rio Negro, obtendo resultados verdadeiramente milagrosos. Para isso, face à distância de Belém e de Lisboa, foi obrigado a deixar de cumprir normas administrativas de que são exemplos a constituição de dívidas para pagar artigos indispensáveis, tais como:

–  Empréstimos para os soldados com soldos atrasados há anos;
– Fornecer aos militares sob a sua ordem, tecidos de algodão produzidos nos teares que implantara, em substituição às fardas que não chegavam nunca. Padecia ao ver que Belém sofria de idêntica situação mas nada fazia;
–  Desenvolveu a agricultura, introduziu o arado, criou várias indústrias e iniciou a criação de gado nos férteis campos do Rio Branco;
–  Aldeou índios, mostrando-se muito orgulhoso de, ter seduzido e pacificado os Mundurucus, que lançavam o pânico sobre os navios que singravam grandes extensões do Amazonas.

Em 1790 assumiu o Governo da Província do Grão-Pará, o Capitão General D. Francisco de Souza Moutinho. Com esse novo Governador rapidamente as relações com Lobo de Almada se deterioraram.

O Coronel respondia com altivez e frontalidade aos reparos que lhe eram feitos e aos quais não estava habituado. Achando-se despojado de fé e crédito assim se queixou ao Secretário de Estado da Marinha:

“Eu não peço à Sua Alteza acrescentamento, nem tamanho soldo como tenho, bastando que me dê muito menos aonde eu o sirva mais”. 

Elaborou e jurou uma relação de seus parcos bens e, desgostoso, viu agravarem-se as sequelas do paludismo, adoecendo gravemente.

Foi promovido a Brigadeiro da Infantaria de Marinha, mas não era isso que nessa altura mais ambicionava.

Junto a um dos seus requerimentos está um lembrete que diz:

“Para se guardar e para se lhe deferir logo que este Governador se ache restabelecido.”  

Não chegou a acontecer… Poucos meses antes de falecer Lobo de Almada voltou a residir em Barcelos, cumprindo ordem transmitida pelo Governador do Pará que a propusera a Lisboa.

Depois de sua morte em Barcelos, em 27.10.1799, cumpriu-se a sua vontade e, em 1804, voltou a capital para o Lugar da Barra, atestando a justeza da escolha de Almada.

Lobo de Almada recusou-se alimentar-se, tomar remédios e até receber o apoio espiritual do Vigário de Barcelos. (1ª Bda Inf Sl)

Morreu de paixão
por sua Missão!!!

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 18.04.2022 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

 (*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: hiramrsilva@gmail.com.

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