Reserva Mamirauá, na Amazônia Central, é a primeira do planeta a ser monitorada inteiramente em tempo real

O Instituto Mamirauá e a Universidade Politécnica da Catalunha, na Espanha, concluíram a instalação de 22 módulos do Projeto Providence, cuja tecnologia inclui técnicas avançadas de inteligência artificial aplicadas a análises de som e imagem, que estão continuamente identificando e rastreando a biodiversidade da floresta amazônica no 1,12 milhão de hectares de floresta protegida da Reserva Mamirauá

© Projeto Providence / Divulgação Postada em: Instituto Mamirauá

Florestas tropicais estão desaparecendo rapidamente do nosso planeta como consequência do desmatamento oriundo da pecuária, exploração madeireira, mineração, perfuração de petróleo, expansão agrícola, construção de estradas e barragens, e expansão de áreas urbanizadas. Esse processo é agravado pelo aquecimento global, e resultou em um aumento alarmante na taxa natural de extinção de espécies, e consequentemente na perda da biodiversidade.

Satélites de sensoriamento remoto e aeronaves científicas fornecem uma riqueza de dados de monitoramento em escala global para monitorar mudanças na cobertura florestal e no uso da terra, mas em resolução espacial e temporal relativamente baixa, e sem a capacidade de monitorar a biodiversidade abaixo do dossel – cobertura superior da floresta formada pelas copas das árvores; portanto, sua utilidade é consideravelmente limitada. Ao mesmo tempo, os métodos de monitoramento da biodiversidade abaixo do dossel, em grandes áreas, utilizando protocolos padrões, e durante longos períodos de tempo, ainda são logisticamente e financeiramente inviáveis.

Projeto Providence promoveu um avanço na forma de monitoramento da biodiversidade nas florestas tropicais, desenvolvendo e implantando uma tecnologia que integra, pela primeira vez, o reconhecimento de espécies através de técnicas de áudio e imagem em um único módulo de hardware. Os módulos do Providence também fornecem informações sobre a “saúde” da floresta tropical, através do cálculo dos índices ecoacústicos da biodiversidade.

Isso permitiu a identificação de mais espécies do que qualquer outra tecnologia disponível, com identificação  automática  em tempo real, e baixo consumo de energia para durar longos períodos, sem a necessidade de manutenção frequente. O impacto dessa tecnologia será enorme, permitindo que pesquisadores, gestores, ONGs (organizações não governamentais), governos e o público em geral entendam, monitorem e prevejam o impacto das mudanças na cobertura florestal, e na integridade da biodiversidade na Amazônia. Uma escala espacial nunca antes pesquisada.

Cada módulo do Providence é independente, e inclui sensores de movimento, visuais, acústicos e ambientais, bem como sistemas de coleta e gerenciamento de energia, incluindo um canal de comunicação de longo alcance para uma estação base. Combinando múltiplas modalidades de sensores, o sistema é capaz de detectar uma variedade muito maior de espécies do que outros métodos utilizados atualmente (por exemplo, armadilhas de câmera, gravadores de som ou avaliações humanas in loco). Sistemas de transmissão de dados de baixo custo têm severas limitações de largura de banda em ambientes de florestas tropicais e, por esse motivo, cada módulo executa a compreensão de dados, bem como realiza a classificação e reconhecimento de espécies baseadas em som e visão multimodal, ou seja, de variadas formas. Todas as informações coletadas pelo equipamento são  transmitidas em tempo real até a estação base. O Providence utiliza de bancos de dados existentes, de assinaturas visuais e acústicas, para treinar o processamento de detecção e classificação  de espécies-chave, construindo-se ao longo de 6 anos do programa, o maior banco de dados bioacústicos de uma floresta tropical.

A Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (RSDM) ou, simplesmente Reserva Mamirauá, foi fundada em 1996 por José Márcio Corrêa Ayres, laureado com o Rolex Awards de 2002, abrangendo 1,12 milhões de hectares. Mamirauá foi a primeira a integrar comunidades indígenas em todas as decisões de manejo, e converter uma reserva natural em um habitat da floresta tropical, onde a conservação e as atividades humanas são equilibradas.

O Projeto Providence começou em 2016, quando o primeiro protótipo de um módulo foi desenvolvido e testado na reserva. Isso foi possível através do encontro de Michel André, Diretor do Laboratório de Bioacsástica Aplicada (LAB) da Universidade Politécnica da Catalunha, na Espanha (UPC), também ganhador do Rolex Awards de 2002, e Emiliano Ramalho, Diretor Técnico-Cientí­fico do Instituto Mamirauá, que vislumbrou uma forma  de revolucionar o  monitoramento da biodiversidade. A ideia original do projeto, era combinar o mais recente desenvolvimento das técnicas de laboratórios de inteligência artificial, para analisar automaticamente sons biológicos em tempo real, com imagens de armadilha de câmera. O conceito de um módulo do Providence nasceu. Seu objetivo é implantar no total 1.000 equipamentos para monitorar toda a floresta amazônica até o ano de 2025.

“Uma das maiores preocupações dos cientistas em todo o mundo é a perda da biodiversidade e a extinção das espécies. Uma avaliação precisa da biodiversidade de uma área como a Amazônia, é essencial para ajudar a combater a perda potencial da vida selvagem”, observa Emiliano Ramalho.

“Estamos coletando dados de sensores acústicos (para animais subaquáticos, bem como terrestres, como pássaros, sapos e macacos), imagens visuais, dados ambientais (vento, temperatura, umidade, pressão do ar) e até imagens térmicas. Os animais de interesse fundamental nas fases de teste são uma variedade de espécies, incluindo onças, macacos, morcegos, aves, répteis, golfinhos de rio e peixes”, acrescenta Emiliano.

O professor da UPC Michel André declara que o monitoramento da vida selvagem com acústica passiva subaquática é uma tecnologia fundamental neste projeto: “Novos desenvolvimentos de sensores e aumento de energia em módulos de processamento, originalmente desenvolvidos para complexos ecossistemas oceânicos subaquáticos, agora são aplicados à conservação de animais terrestres e aquáticos pela primeira vez em um ambiente de grande escala como a Amazônia”.

“Um dos nossos maiores desafios, é lidar com uma transmissão ao vivo de dados contendo sons e imagens de um enorme número de animais conhecidos, e provavelmente várias espécies desconhecidas, desde os menores insetos até as onças. Essa biodiversidade única de sons será transmitida online para que a comunidade científica e o público em geral possam acompanhar nosso progresso em tempo real a partir do conforto de sua sala de estar”,  diz o professor André.

“A integração das tecnologias envolvidas no projeto Providence revolucionará a forma como monitoramos a biodiversidade em florestas tropicais ao redor do mundo”, afirmam os cientistas.

Emiliano Ramalho e Michel André concluem: “O Providence  possibilitou, pela primeira vez, a criação de um sistema preciso de registro e avaliação do status da biodiversidade dessa região na Amazônia, e forneceu um sistema de alerta, alertando para qualquer mudança que pudesse ameaçar seus incríveis habitantes da vida selvagem”.

O Projeto Providence é financiado pela Fundação Gordon e Betty Moore desde 2016, com o apoio da Rolex como parte de sua iniciativa Perpetual Planet, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações do Brasil (MCTI) e da DENSO Industrial da Amazônia LTDA.

PUBLICADO POR:    INSTITUTO MAMIRAUÁ

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