Série especial: Etnia Haliti-Paresi aposta no turismo para fortalecer a tradição indígena

Belezas naturais, rituais, danças, pintura corporal. Tudo isso faz parte da rotina dos indígenas Haliti-Paresi, que vivem no Mato Grosso, e também está ao alcance dos turistas. Nos últimos anos, o turismo comunitário ganhou força na região, contribuindo para a o fortalecimento cultural e a geração de renda nas aldeias, servindo de exemplo para outras etnias.

Etnia Haliti-Paresi consolidou o turismo comunitário no Mato Grosso. Fotos: Guto Martins / Funai

Nesta série especial, a Fundação Nacional do Índio (Funai) conta um pouco dessa história. Confira!

Desde dezembro de 2021, a Aldeia Wazare, localizada na Terra Indígena Utiariti, liderada pelo cacique Rony Azoinayee, possui a Carta de Anuência da Funai para a atividade de visitação com fins turísticos na modalidade de etnoturismo e turismo cultural indígena de vivência. A iniciativa promove a valorização da cultura tradicional, além de colaborar para a autonomia financeira dos indígenas.

O presidente da Funai, Marcelo Xavier, conheceu a estrutura da Wazare em dezembro e entregou pessoalmente a Carta de Anuência às lideranças da aldeia. Ele participou do evento de inauguração da hati, a tradicional casa indígena construída na Terra Indígena Utiariti. Ao visitar o espaço, Xavier ressaltou a importância de manter vivas as tradições indígenas, mas também de oferecer apoio para o desenvolvimento.

“A Funai entende que o indígena tem que ser o protagonista da sua própria história e ter autonomia para fazer suas escolhas, sendo que ele não deixa de ser indígena por buscar melhores condições de vida. Na atual gestão temos o compromisso de levar etnodesenvolvimento aos indígenas e isso tem potencializado projetos sustentáveis em aldeias de todo o Brasil. É o caso dos Paresi, por exemplo”, destaca o presidente da Funai. Xavier ressalta ainda que a experiência exitosa dos Paresi pode servir de modelo para outras aldeias, sempre com respeito à autonomia e vontade dos indígenas.

Rony é o maior entusiasta e articulador da proposta de atividade sustentável na região, rica em história e em belezas naturais. Ele fala com propriedade e empolgação sobre a temática. “O protagonismo que buscamos hoje vem sendo construído pelos Paresi de forma coletiva, com objetivo de dar visibilidade à nossa cultura, mas também de fortalecer a geração de emprego e de renda. Como qualquer outro cidadão, nós queremos viver em harmonia, com dignidade, oportunidades, com acesso à educação, à saúde. Ao longo dos anos criamos pequenas estruturas, construímos um esboço de projeto para o turismo cultural, escrevemos um plano de visitação que hoje é usado como base do turismo. Não foi de uma hora para outra, são pelo menos 10 anos de trabalho, sem contar todo o planejamento dos nossos antepassados. Hoje estamos colocando as ideias em prática”, afirma o cacique da aldeia Wazare.

Entre os meses de abril e outubro, diversas atividades são oferecidas aos visitantes na aldeia Wazare: desde a vivência indígena, com um dia de imersão na cultura trajando as vestes tradicionais e a pintura corporal – com a explicação do significado e de sua representação na história cultural da etnia –, até apresentação cultural com danças, rituais e mostras de projetos desenvolvidos no local, como avicultura, horticultura e piscicultura, mantendo a tradicionalidade indígena.

O turismo comunitário da aldeia Wazare se fortaleceu após a criação do Plano de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA) das nove terras indígenas Haliti Paresi, elaborado entre 2016 e 2019. Para a implementação do PGTA Paresi, as associações Waymaré e Halitinã – organizações que representam os Haliti – escolheram seis aldeias que já vinham realizando atividades turísticas. Em 2019, iniciou-se o projeto para o fortalecimento do turismo, com a elaboração de planos de visitação e a realização de oficinas de formação e expedições de mapeamento das trilhas e da estrutura local.

Casa tradicional ganha visual moderno

A tradicional casa (hati, na língua indígena e popularmente conhecida como oca pelos não-indígenas, mesmo não sendo a expressão correta, segundo o cacique) foi construída artesanalmente pelas lideranças da Aldeia Wazare em estilo inovador. Hoje, é um dos principais pontos turísticos da região. A casa mede 25 metros de comprimento, 10 metros de largura e 6,10 metros de altura.

Segundo o cacique Rony, essa é, hoje, a maior hati construída no país. O piso foge do tradicional chão batido e dá espaço ao porcelanato, segundo o cacique, por dois motivos: para mostrar que é possível avançar para a modernidade mantendo as tradições indígenas, e “para deixar minha esposa feliz, era o sonho dela ter uma casa com o piso assim”, conta. A construção fortalece a atividade de etnoturismo na comunidade, na medida em que estimula a visitação turística de não-indígenas.

Cachoeiras atraem turistas à região

Falar do desenvolvimento do turismo na Terra Indígena Utiariti é motivo de orgulho para o cacique da Aldeia Rio Sacre e um dos coordenadores do projeto de Etnoturismo da etnia Haliti-Paresi, Ivo Zukenazokemae. Ele conta que, desde 2020, pensava em trabalhar na área turística, mesmo atuando há cerca de 22 anos como profissional de saúde pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), vinculada ao Ministério da Saúde.

“Eu sabia do nosso potencial devido ao atrativo que temos a oferecer, das nossas belezas naturais, mas na época era inviável pois não havia amparo legal. Quando decidi sair do meu emprego, procurei a Secretaria de Cultura e Turismo do Município de Campo Novo do Parecis para solicitar a nossa inclusão no projeto Rota Parecis. A partir disso, comecei a estruturar a aldeia para receber os turistas”, conta Zukenazokemae.

O projeto foi criado pela Secretaria entre 2018 e 2019 e contava com a participação das aldeias Ponte de Pedra, Wazare, Quatro Cachoeiras, Salto Belo e Utiariti. “A Aldeia Rio Sacre não existia na época, então decidi correr atrás para fazer essa adesão e oficializar o nosso desejo em ser um destino turístico também”, explica o cacique. O objetivo era promover visitações nas cachoeiras locais, divulgar a cultura indígena e oferecer aos turistas os adereços produzidos na região.

“Com isso, além de gerar emprego e renda aos meus familiares, posso oportunizar isso aos parentes de outras aldeias também. No acesso à cachoeira temos cinco quiosques que foram produzidos por um parente de outra região, temos adereços como arco e flecha, cestas e cocar feitos por um Nambikwara. Isso valoriza a nossa cultura e a convivência social entre os indígenas de aldeias diferentes”, ressalta Zukenazokemae, ao destacar que o projeto também movimenta a economia de municípios vizinhos, como Tangará da Serra e Campo Novo do Parecis. “Muitos visitantes de outros estados ficam hospedados em hotéis parceiros nossos, então todo mundo é beneficiado.”

Na época de seca, entre os meses de abril e outubro, a procura pelo turismo aumenta na região. Na aldeia Rio Sacre a visitação ocorre de terça-feira a domingo, com maior movimento aos fins de semana. “Recebemos de 40 a 60 turistas entre sábado e domingo, com agendamento prévio. Em 2022 vamos trabalhar para melhorar a estrutura local, ampliar os serviços e oferecer mais opções aos turistas. Nossa cultura não vai se fragilizar com esse trabalho, pelo contrário. Através do etnoturismo estamos rompendo barreiras e pontos negativos que muitas pessoas tinham e ainda têm sobre os índios. Vamos mostrar que somos contemporâneos, da época digital e da globalização. Isso só fortalece a nossa cultura”, ressalta o cacique.

Ivo acredita que os indígenas precisam estar integrados à realidade e ao contexto atual. “Não podemos parar no tempo. Chegou o momento de o próprio indígena desenvolver atividades de acordo com sua realidade e suas demandas. O protagonismo indígena nesse momento é importante para desenvolver independência econômica, para o índio andar com as próprias pernas. E isso não é desmerecer a nossa cultura, estamos buscando protagonismo e autonomia pra viver com dignidade”, afirma, com entusiasmo.

Medidas preventivas

Tendo em vista o avanço da vacinação dos indígenas contra a covid-19, as atividades turísticas em Terras Indígenas (TIs) estão sendo retomadas gradativamente mediante protocolos sanitários específicos. Entre as exigências, está a realização de exame PCR e apresentação da carteirinha de vacinação.

As medidas foram estabelecidas após análise, pela Funai e pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), quanto à viabilidade da continuidade de projetos de turismo de pequeno porte nas TIs. Foi autorizado o prosseguimento dos projetos desde que observados os protocolos sanitários definidos pelas autoridades competentes em nível local, regional e/ou nacional, e também levando-se em consideração o respeito à autonomia dos indígenas.

Serviço

Os interessados em mergulhar na cultura indígena e conhecer as belezas naturais da Terra Indígena Utiariti podem visitar a área, especialmente no período entre abril e outubro, época ideal com poucas chuvas na região. A Aldeia Wazare disponibiliza pacotes de visitação aos turistas por meio de agências de viagem e, também, diretamente pelo contato com as lideranças da aldeia, pelas redes sociais como Facebook e Instagram, @aldeiawazare ou pelo telefone: (66) 99935-4727.

A Aldeia Rio Sacre recebe turistas de terça-feira a domingo. Os agendamentos podem ser feitos via Instagram, @aldeiariosacre ou @aldeiariosacre.ivo e, também, pelo Whatsapp: (65) 99619.5619.

Assessoria de Comunicação / FUNAI

ver repertório fotográfico em:  Série especial: Etnia Haliti-Paresi aposta no turismo para fortalecer a tradição indígena — pt-br (www.gov.br)

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