A Terceira Margem – Parte CCLXIII

Expedição Centenária Roosevelt-Rondon  2ª Parte – IV  

Partida de Cáceres, MT

Cáceres – Ilha da Amizade I  

Pensando no crescimento do agronegócio mato-grossense, o Grupo Fogliatto com seu Diretor Presidente Argeu Fogliatto, no ano de 1983 adquiriu a Fazenda Porto do Campo, localizada no município de Lambari do Oeste, MT. A partir daí desenvolveu um projeto ecológico de abertura de área, com ideias revolucionarias que transformou a fazenda em um modelo de desenvolvimento ecológico e sustentável.

Jabiru mycteria – Rio Paraguai, Cáceres, MT

23.10.2015 (sexta-feira) – Navegando o Paraguai 

Partimos de Cáceres, margem esquerda do Rio Paraguai, às 15h20 em duas pequenas, mas confortáveis, voadeiras pilotadas pelo alemão e pelo Angonese, dando início à etapa mais tranquila de nossa Expedição.

Ponte Marechal Rondon, Rio Paraguai, Cáceres, MT.

Apesar de ser uma sexta-feira, as margens estavam tomadas por pescadores ou grupos de banhistas que aproveitavam as águas ou a sombra da vegetação para escapar da canícula. Avistamos urubus, biguatingas e dois enormes e preguiçosos tuiuiús (Jabiru mycteria) pescando pequenos e inocentes lambaris sem ao menos precisar entrar n’água. Volta e meia o alarido provocado por bandos de araras e periquitos quebrava, momentaneamente, a tranquilidade da natureza que nos envolvia.

Foz do Sepotuba (Google)

Depois de navegarmos por aproximadamente 30 km, encontramos a Foz do Rio Tenente Lyra (15°55’23,6”S / 57°39’05,0”O). Deixamos, então, o Rio Paraguai para trás e adentramos no Sepotuba. A jusante da Foz atual avista-se uma segunda Foz que pode ter sido o leito do Rio anteriormente. Os Rios de planície são inconstantes e tumultuários e tem a necessidade de redesenhar seus cursos continuamente.

Pesqueiro D. Josefina (Google)

A perda da mata ciliar, a ação antrópica e o consequente assoreamento aceleram ainda mais este processo. Aportamos no nosso destino, Pesqueiro da D. Josefina (15°42’44,3”S / 57°40’01,6”O), sogra do nosso guia e piloteiro “Alemão”, a 72 km de Cáceres, às 18h30. Tentamos, sem sucesso, fazer contato pelo celular com familiares e amigos e depois de um saboroso peixe assado preparado pela D. Josefina fomos dormir em nossas barracas armadas sob um tapiri.

24.10.2015 (sábado) – Navegando o Sepotuba 

Pesqueiro da Dona Josefina.

Partimos às 09h40 do Pesqueiro da D. Josefina e, depois de percorrer 08 km, às 10h00 aportávamos na Fazenda Porto do Campo (15°42’36,3”S / 57°42’38,4”O) de propriedade do Sr. Argeu Fogliatto. A família Fogliatto tem uma história de sucesso ligada ao melhoramento genético do gado nelore que é considerado como um dos melhores do Brasil.

Pesqueiro da Dona Josefina

O Sr. Argeu concedeu-nos uma entrevista, à sombra de uma mangueira que teria sido plantada, em 1914, por Theodore Roosevelt, discorrendo sobre sua trajetória de vida e sua parceria de sucesso com os índios Paresí.

Sr. Argeu Fogliatto, Fazenda Porto do Campo

 

A história da propriedade está intimamente ligada às Expedições promovidas por Rondon e sua equipe. O Sr. Argeu mostrou-nos a figueira onde Rondon teria determinado que pendurassem o veado abatido por Roosevelt:

Penduramos o veado numa árvore (ROOSEVELT).

Difícil confirmar tal versão baseado apenas nos diários de Roosevelt e Rondon, mas o Sr. Argeu afirma que assim reza a tradição oral.

Sr. Argeu Fogliatto e filhos, Fazenda Porto do Campo

Posso afirmar, porém, com certeza, que, em 1912, sob a mencionada figueira, foram montadas as redes de Rondon e Roquette-Pinto:

No mesmo dia da partida armamos nossas redes à margem direita do Sepotuba, debaixo de uma figueira enorme, na fazenda de Porto do Campo. (ROQUETTE-PINTO).

As instalações de fazenda primam pelo bom gosto, limpeza e funcionalidade e a bela e centenária residência da Fazenda foi reformada e ampliada mantendo o estilo arquitetônico da época.

Partimos, depois de desfrutar de um lauto almoço com a hospitaleira família Fogliatto.

Encerramos nossa jornada, depois de navegar por mais de 85 km, na Ilha da Amizade (15°02’01,0”S / 57°41’56,0”O) onde, depois de nos refrescarmos nas corredeiras do Rio, jantamos e pernoitamos na varanda da residência de um amável pescador.

Rio Sepotuba, MT

Relatos Pretéritos – Rio Tenente Lyra ou Sepotuba  

06 a 08.01.1914 

Magalhães 

As 15h00 do dia 6, partiu o Nyoac, Rio Paraguai acima, penetrando em seguida pelo curso do Sepotuba, e no dia seguinte às 15h45 parava junto à fazenda do Porto do Campo […] (MAGALHÃES, 1916)

Ilha da Amizade – Rio Sepotuba, MT.

Roosevelt 

06.01.1914: Após deixarmos Cáceres, subimos o Rio Sepotuba, que no dialeto dos índios da região significa “Rio das Antas”. Este Rio só é navegável para navios grandes quando as águas estão altas. É de corrente rápida e belas águas claras, que desce das terras elevadas do planalto e se estende através da floresta tropical da baixada.

Fazenda Porto Campo (FUNAI)

O Rio Sepotuba nasce no Norte do estado do Mato Grosso, estando suas nascentes situadas nas escarpas da Chapada dos Paresí, que possui até 800 metros de altitude. Esta chapada é o divisor de águas entre a Bacia Amazônica e a Bacia do Paraguai. À nossa direita, ou na margem Ocidental, e a espaços na margem esquerda, a mataria é interrompida por pastagens nativas e campinas.

07.01.1914: Num destes locais, chamado Porto do Campo, de 60 a 70 quilômetros acima da Foz, existe uma fazenda de boa extensão. Ali fizemos alto, pois a lancha e as duas pranchas – embarcações nativas de comércio, com casa no convés – que ela rebocava, não comportavam toda a comitiva e bagagem.

Assim, grande parte da bagagem e alguns do nosso grupo foram mandados à frente para Tapirapuã, ponto onde devíamos encontrar nossa tropa cargueira.

Enquanto isso, nós com o resto da comitiva fizemos nosso primeiro acampamento de barracas em Porto do Campo, para aguardar a volta das embarcações. As barracas ficaram enfileiradas. Ao centro, lado a lado, a do Cel Rondon e a que abrigava a mim e a Kermit. Em frente às duas, em altos mastros, as bandeiras do Brasil e da América; ao nascer e ao pôr do Sol as bandeiras eram içadas e arriadas ao toque de corneta e nós todos nos perfilávamos.

O acampamento foi instalado junto à casa da fazenda. Nas árvores próximas viam-se admiráveis orquídeas violáceas. […]

08.01.1914: Certo dia, quando remávamos numa canoa esperando que os cães tocassem uma anta para nós, eles trouxeram para o Rio um casal de pequenos veados catingueiros. Não seria decente matá-los a tiro, por isso apanhamo-los a laço. Os naturalistas queriam obtê-los como espécimes; e nós outros como petisco. Um dos homens foi picado por um marimbondo vermelho. Sentiu fortes dores durante 24 horas e ficou impossibilitado de trabalhar.

Em uma lagoa 2 cães tiveram as pontas das caudas arrancadas por piranhas, quando nadavam, e o pessoal da fazenda contou que na mesma lagoa um cão fora despedaçado e devorado por aqueles peixes vorazes. Foi esse um outro exemplo a mais da variedade de comportamento daqueles monstrozinhos ferozes. Em outras lagoas deixaram incólumes a nós e aos cães por vezes repetidas. Variam em agressividade conforme o local, exatamente como os tubarões e crocodilos […] (Continua)

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 20.07.2021 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

Filmete 

https://www.youtube.com/watch?v=-ek3beISFFA&t=456s 

Bibliografia   

MAGALHÃES, Amílcar A. Botelho de. Anexo n° 5 – Relatório Apresentado ao Sr. Coronel Cândido Mariano da Silva Rondon – Chefe da Comissão Brasileira – Brasil – Rio de Janeiro, RJ, 1916

ROOSEVELT, Theodore. Através do Sertão do Brasil ‒ Brasil ‒ Rio de Janeiro, RJ ‒ Companhia Editora Nacional, 1944.  

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA) (2000 a 2012);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: hiramrsilva@gmail.com.

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