A Terceira Margem – Parte CLXXV

Foz do Breu, AC/ Manaus, AM ‒ Parte LI 

Com. Estirão das Gaivotas – Com. Tamaniquá, AM

Juruá, AM – Tefé, AM II 

Com. Estirão das Gaivotas – Com. Tamaniquá, AM

17.02.2013 – Estirão das Gaivotas – Tamaniquá 

Com. Estirão das Gaivotas – Com. Tamaniquá, AM

Dormi mal, a expectativa era muito grande. Estava prestes a me despedir definitivamente do Juruá, este belo, tumultuário e sinuoso amigo, encantador, pleno de surpresas, por certo, mas que exigira de cada membro da Expedição o limite de sua força, tenacidade, capacidade de vencer o cansaço, o calor insuportável, o assédio constante dos insetos, o desconforto muscular e a inalterável incerteza de encontrar um abrigo seguro e salubre ao final de cada jornada. Para conseguirmos completar nossa próxima meta de 135 km, precisaríamos contar com a boa vontade de São Pedro, uma determinação férrea e torcer para que nossos músculos cansados e maltratados aguentassem mais este supremo esforço.

Com. Estirão das Gaivotas – Com. Tamaniquá, AM.

Partimos às 05h30 da manhã, imprimindo inicialmente um ritmo lento para aquecer progressivamente nossas fibras musculares. Uma agradável garoa acariciava-nos como querendo mostrar que São Pedro, o Santo Padroeiro do meu pago, Mestre dos ventos e das chuvas nos prometia uma trégua neste derradeiro dia vagando pelo Juruá. Curiosamente confirmava-se a previsão, feita na noite anterior por um dos moradores da Comunidade que, apesar da noite muito clara e sem nuvens, afirmara categoricamente que iria chover a manhã inteira.

Com. Estirão das Gaivotas – Com. Tamaniquá, AM

Confirmamos igualmente, no terreno, o que nos informara o Secretário Extraordinário do Município de Juruá, José de Arribamar, o grande vazio demográfico que existia desde o Estirão até a próxima Comunidade em condições de se buscar abrigo, exatos 60 quilômetros. A chuva só parou por volta das 13h00 e o calor amazônico começou a minar nossas forças. Por volta das 15h00, o Arribamar passou por nós numa embarcação escolar e, daí em diante, fomos costurando nossas rotas já que o dinâmico Secretário estava realizando a matrícula escolar das crianças ribeirinhas e, para isso, precisava aportar em cada Comunidade.

Com. Estirão das Gaivotas – Com. Tamaniquá, AM

Chegamos à Foz do Juruá às 17h30 e me surpreendi com a mudança processada nos últimos 4 anos, a Com. Nova Matusalém (antiga Porto Columbiano) que ficava à margem direita da Boca do Juruá simplesmente sumira.

Com. Estirão das Gaivotas – Com. Tamaniquá, AM

O Rio, que antes apontava para Leste num percurso de 5 km até encontrar o Solimões, retificara sua rota final rumo Norte e assoreara o antigo braço aterrando-o. Encontramos, depois, reedificada, Nova Matusalém a cinco quilômetros à jusante da Foz.

Com. Estirão das Gaivotas – Com. Tamaniquá, AM
Missão Cumprida!!!

Lazareto de Almas 

Tamaniquá, AM

É o mais original dos lazaretos – um lazareto de almas! Ali, dizem, o recém-vindo deixa a consciência… A Ilha que existe à Boca do Purus, perdeu o antigo nome geográfico e chama-se Ilha da Consciência; e o mesmo acontece a uma outra, semelhante, na Foz do Juruá. É uma preocupação: o homem, ao penetrar as duas portas que levam ao paraíso diabólico dos seringais, abdica às melhores qualidades nativas e fulmina-se a si próprio, a rir, com aquela ironia formidável. (Euclides da Cunha)

Tamaniquá – Flutuante Novo Horizonte – RDS Mamirauá, AM

Quando desci o Solimões, em dezembro de 2008, ainda se podia vislumbrar o que restara da abalada Ilha da Consciência. Naquela época, ela já era uma mera sombra do que fora no passado. Parece que a natureza resolvera definitivamente exterminar este “lazareto de almas”, como se quisesse varrer da memória ancestral as sandices outrora praticadas.

Flutuante Novo Horizonte – Flutuante Cauaçu , AM

A Expedição General Bellarmino Mendonça cumpriu sua missão e comemoramos, à nossa maneira, na Foz do Juruá, a conclusão desta difícil jornada. Chegamos a Tamaniquá, às 18h30, exaustos. O Mário já tinha feito os contatos necessários e fomos alojados na escolinha com acesso à cozinha e ao banheiro. Os 870 km que nos separavam de Manaus seriam percorridos com muita tranquilidade, um passeio por águas conhecidas.

Flutuante Cauaçu – Flutuante Cauaçu, AM

²Total Parcial:  Juruá ‒ Foz no Solimões =             219,0 km

²Total Geral:    Foz do Breu ‒ Foz no Solimões = 2.957,5km

18 e 19.02.2013 – Tamaniquá – RDS Mamirauá

Flutuante Cauaçu – Flutuante Cauaçu, AM

Graças ao Coordenador de Operações do Instituto Mamirauá, Sr. Armando Athos Rebelo de Medeiros Filho, conseguimos autorização para pernoitar nos confortáveis Flutuantes Novo Horizonte e Cauaçu.  Nosso caro amigo Josivaldo Ferreira Modesto, mais conhecido como César Modesto é agora Coordenador do Núcleo de Inovações Tecnológicas Sustentáveis. O César havia nos apoiado incondicionalmente por ocasião de nossa Descida pelo Solimões.

Flutuante Cauaçu – Tefé, AM

20.02.2013 – Flutuante Cauaçu – Tefé 

O General PAULO SÉRGIO Nogueira de Oliveira, Comandante da 16° Brigada de Infantaria de Selva, Tefé, AM, montou um aparato fantástico para nossa chegada em Tefé. Pela primeira vez desde que iniciei minhas descidas pelos amazônicos caudais, tive uma recepção desta magnitude. Fomos acompanhados, desde a Boca do Lago de Tefé no Solimões até o porto de Tefé, por uma escolta fluvial e, na chegada, além dos sons marciais proporcionados pela excelente Banda de Música da 16ª Bda Inf Sl e dos fogos de artifício, fomos recepcionados pelo Chefe do EM Coronel Dougmar Nascimento das MERCÊS, TCel Marcelo ROJO, Comandante da 16ª Base Logística de Selva e diversos oficiais do alto comando da 16ª Bda. Chorei de pura emoção!

Flutuante Cauaçu – Tefé, AM

O E/5 da Bda, Capitão Diógenes PINHEIRO Pimentel, havia agendado diversas entrevistas na Cidade e, além delas, à noite, fui entrevistado, às 21 horas, via celular pelos nossos fiéis amigos da AmazonSat que nos acompanham a par e passo desde o início de nossa jornada no Acre.

Flutuante Cauaçu – Tefé, AM

O caro Ir:. Carlos Athanásio também havia agendado uma entrevista na Rádio Luz e Alegria de Frederico Westphalen (FW), RS, para as 19h00 (hora do Amazonas). Nessa entrevista, lembrei que, desde que iniciei, há 13 anos uma série de palestras sobre a Amazônia Brasileira, hoje ultrapassam a 400, esta foi a terceira vez que não consegui segurar a emoção e as lágrimas escorreram sobre a face enrugada deste velho guerreiro.

Flutuante Cauaçu – Tefé, AM.

A primeira foi em FW, RS, quando o Ir:. Carlos convidou-me a realizar uma palestra para estudantes do ensino fundamental do Colégio Nossa Senhora da Auxiliadora. Ao final do evento, as crianças vieram me abraçar, beijar e pedir autógrafos, chorei e, ao olhar para meus irmãos maçons, que me acompanhavam, Carlos, Deoclécio e Teixeira, vi que eles também não tinham conseguido conter as lágrimas. Quando me perguntam por que não cobro pelas palestras, eu digo que este é o meu pagamento – a emoção de ter transmitido algo que tenha, de alguma forma, repercutido no coração e nas mentes das criaturas.

A segunda foi a recepção, em Santarém, na minha descida pelo Amazonas. Meu ex-Cadete e na época Comandante do 8° Batalhão de Engenharia de Construção acompanhou-nos na chegada com a Balsa Rondon. Na Rondon, além dos repórteres das diversas emissoras e jornalistas, estavam a bordo os militares do Batalhão e seus familiares. Depois da recepção pela imprensa de Santarém no Porto Hidroviário, fomos homenageados pelo Comandante e seus oficiais no Clube Militar, onde recebemos uma série de brindes.

Adeus, Irmão Juruá 

Flutuante Cauaçu – Tefé, AM.

Concluindo agora minha saga pelo Rio mais sinuoso do mundo, só tenho a agradecer a todos que, de uma maneira ou outra, colaboraram para que atingíssemos nosso objetivo. Tivemos, desde o início, o apoio fundamental do Exército Brasileiro através da 16ª Brigada de Infantaria de Selva, sediada em Tefé, AM, e seu 61° Batalhão de Infantaria de Selva, Cruzeiro do Sul, AC; do 2° Grupamento de Engenharia, Manaus, AM, representado pelo 5° Batalhão de Engenharia de Construção; Porto Velho, RO, 7° Batalhão de Engenharia de Construção; Rio Branco, AC e 8° Batalhão de Engenharia de Construção, Santarém, PA.

No Acre e no Amazonas, fomos apoiados pelas Polícias Militares desses Estados. Gostaríamos de agradecer particularmente ao Capitão PM Moura e Sgt PM Antônio que nos apoiaram em Cruzeiro do Sul, AC, e Porto Valter, AC, ao Tenente PM Rodney, em Ipixúna, AM, Tenente PM Ricardo em Eirunepé, AM, Sargento PM Barbosa em Itamarati, AM, Tenente PM Alain em Carauari, AM, e Tenente PM Jesus no Juruá, AM.

Tefé, AM.J

Além destas Instituições, fomos assistidos pelos irmãos maçons de Eirunepé, AM, e Carauari, AM, liderados pelos veneráveis Ir:. Francisco Djanir e Santiago, respectivamente, pelo Sr. Armando Athos Rebelo de Medeiros Filho do Instituto Mamirauá de Tefé, AM, e pelo empresário Abraão Cândido em Ipixúna, AM.

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 18.03.2021 –  um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.  

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;  

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: hiramrsilva@gmail.com.

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