A Terceira Margem – Parte CXIV

Porto Velho, RO/ Santarém, PA ‒ Parte LXXXIV

Jornal do Brasil, n° 278, 26.11.1960

Descendo o Rio Madeira ‒ XV 

Anexo DEPEX – 1032/60, 09 de agosto de 1960. 

Avaliação das Possibilidades Petrolíferas das Bacias Sedimentares do Brasil

Introdução 

Neste memorando sobre as possibilidades petrolíferas das Bacias Sedimentares do Brasil, e que será provavelmente uma análise final antes de partimos no fim do ano, tentaremos mostrar a situação em bases absolutamente impessoais, usando somente os fatos geológicos conhecidos. Infelizmente, os dados geológicos que possuímos não retratam o conjunto do quadro, mas apenas fragmentos do mesmo. […]

Esta análise é principalmente a do missivista, mas inclui ideias e pontos de vista básicos obtidos do trabalho de exploração feitos no Brasil por um grupo de técnicos que constitui o Departamento de Exploração no Rio e nos Distritos. […]

O Vale Amazônico 

A única geologia sedimentar visível no Amazonas, de interesse para o geólogo de petróleo, é a faixa de afloramento Paleozoico nas margens Sul e Norte da Bacia entre as longitudes 51° e 62° à Oeste de Greenwich. Esta faixa tem uma largura média de 50 km.

No Acre existe uma seção de afloramento Cretáceo ao longo da fronteira Peruana representada pelo complexo anticlinal ([1]) de Moa. As áreas sedimentares que podem dar informações geológicas representam menos de 1% do Vale Amazônico o resto acha-se coberto por camadas planas das eras Terciária, Quaternária e Mesozoica.

Entretanto, durante vários anos o Vale Amazônico foi considerado de valor potencial sob o ponto de vista petrolífero e a perfuração nas faixas de afloramento das Bacias do Acre e Amazonas iniciou-se já em 1926. Quatro poços foram perfurados no Domo de Monte Alegre, perto da cidade do mesmo nome, e vários outros no Acre.

Um total de 15 poços foi perfurado antes do início dos trabalhos do CNP. O CNP, perfurou 3 poços na área de Marajó e iniciou a perfuração de 2 outros na parte principal da Bacia Amazônica em Nova Olinda e Alter do Chão perto de Santarém. O CNP realizou também trabalhos de gravimetria e sismografia do Vale Amazônico.

A PETROBRAS continuou e incrementou o trabalho de exploração na Amazônia empregando todas as técnicas geológicas e geofísicas conhecidas, secundadas por grandes números de perfurações estratigráficas e pioneiras.

A PETROBRAS perfurou mais de 75 poços na parte principal do Vale Amazônico e no Graben do Marajó e efetuou vários levantamentos geofísicos dispendiosos nos últimos 5 anos. Com base neste trabalho, torna-se agora possível uma boa avaliação de potencialidade do Vale Amazônico e do Acre.

– Bacias Geológicas do Vale Amazônico

Geologicamente o Vale Amazônico pode ser dividido em 4 Bacias distintas que são: […]

– 2) Bacia do Médio Amazonas; […]

– Bacia do Médio Amazonas

O delineamento desta Bacia tornou-se possível somente pelo trabalho geológico e geofísico, secundado por perfuração pioneira e estratigráfica. A Bacia termina a Leste pelo Arqueamento do Gurupá e a Oeste pelo do Purus. É uma Bacia Paleozoica, quase toda coberta por sedimentos planos do Mesozoico ao Quaternário. A maior concentração do esforço exploratório foi nesta Bacia, devidos aos primeiros indícios de óleo em Nova Olinda onde se produziu 4.000 bbs de óleo. Autás Mirim produziu 1.800 bbs. Todas as ocorrências de óleo do Médio Amazonas acham-se dentro de um raio de 150 km, tendo Nova Olinda como centro, excetuando-se o poço de Faro, onde uma pequena amostra de gás foi testada dando uma estimativa de 150.000 pés cúbicos diários. Baseado no que foi dito acima concluímos que:

1) A Bacia do Médio Amazonas satisfez as exigências das formações geradoras de óleo nas Formações Curuá e possivelmente também Nova Olinda; […]

Reunindo todos esses fatores, sem se considerar as dificuldades causadas pela capa de lava no topo do Paleozoico e a intrusão no mesmo, o melhor grau de avaliação que se poderá dar ao Médio Amazonas é “D”, o que prova ser a Bacia bem marginal e a área pobre, para a produção em larga escala. […]

Respeitosamente, Walter K. Link.

DEPEX – 1058/60, 29 de agosto de 1960.  

Ao: General Idálio Sardenberg […]

Do: Walter K. Link

Programa de Exploração para 1961

Senhores:

Em anexo encontra-se o programa de exploração proposto para 1961, que recomenda a continuação da exploração no ritmo de 1960 nas Bacias de Sergipe e do Recôncavo, e o aumento de atividade na Bacia de Tucano.

Nenhuma exploração nas Bacias “D” do Acre, Alto Amazonas, Baixo Amazonas, e na faixa costeira do Espírito Santo e Sul da Bahia, é considerado. Julgamos também que uma exploração nas Bacias de classe “C” como o Médio Amazonas, Maranhão, Barreirinhas, Alagoas e Sul do Brasil, não pode ser justificada do ponto de vista geológico. […]

A única Bacia paleozoica que recebeu avaliação “C” ou superior por todos os geólogos, é a Bacia do Médio Amazonas. O óleo livre encontrado em Nova Olinda e Autás Mirim sem dúvida contribuiu para isso.

Nós todos consideramos uma avaliação “C” como marginal, recomendo à Diretoria que leia novamente e revise a carta do signatário DEPEX/DDO – 527 de 14.09.1959. Essa carta menciona os grandes gastos em dinheiro nesta área sem encontrar óleo comercial, e exploração subsequente não modificou esse quadro. […]

Sinceramente, Walter K. Link.

Reações ao Relatório Link 

Jornal do Brasil, n° 278 ‒ Rio de Janeiro, RJ
Sábado, 26.11.1960 

Petróleo Paixão e Posse 

Foi reaberto o debate sobre a questão do petróleo. Como de costume, o problema é discutido em termos emocionais e às vésperas de uma mudança de Governo. Aliás, é significativo ver-se que a primeira pergunta que se faz, depois da eleição de um novo Presidente da República, é esta:

– Entregará ele o petróleo?

O Sr. Jânio Quadros, como candidato, cansou-se [e a todos nós] de afirmar que é favorável ao monopólio estatal do petróleo. Isso, porém, não sossegou os sempiternos “defensores do petróleo” nem aqueles ditos realistas que afirmam, ao mesmo tempo, duas teses contraditórias: a de que as jazidas brasileiras de petróleo são insuficientes e a de que o Brasil só extrairá petróleo em quantidade suficiente quando fizer concessões a capitais estrangeiros. […]

No entanto, se é errado ceder-se às pressões contra o monopólio, também não é certo considerar-se infalível a empresa estatal. A PETROBRAS, como bem disse o Sr. Jânio Quadros, não é intocável. Todo mundo sabe que ela se transformou num poleiro de empregos e tem negligenciado em cumprir a sua missão principal, que é a de pesquisar o petróleo em todo o território nacional. Limita-se a PETROBRAS a tirar o petróleo do Recôncavo Baiano, explorando a todo pano as reservas conhecidas.

As denúncias a respeito são numerosas, mas só agora alguns defensores do petróleo começaram a admitir essa hipótese por eles considerada inadmissível ao tempo em que a empresa era administrada pelo intocável Sr. Janari Nunes.

Discutem-se, agora, a competência e a idoneidade de um técnico norte-americano contratado, há muito tempo, pela PETROBRAS: Sr. Walter Link. Em relatório, o Sr. Link e outro técnico, o Sr. Luís Morales, colombiano, disseram que o Brasil não tem condições de ser um grande produtor de petróleo. A sua geologia, segundo eles, é ingrata. O relatório, ao que se diz, data de 1959 (?), e foi divulgado na época. Contra ele é apresentado o relatório do Coronel Geisel, que denúncia manobras contra PETROBRAS dentro da própria PETROBRAS. Também este, ao que se afirma, é antigo. É o caso de se indagar por que esses documentos foram exumados, em conferência na Escola Superior de Guerra e em discursos na Câmara dos Deputados, nesta hora em que não falta quem procure copos de água para fazer tempestades. O fato, porém, é que se reabriu o debate. E, se todos querem mexer no assunto, que seja feita uma investigação nas atividades da PETROBRAS. A Câmara Federal terá uma boa oportunidade de fazer um inquérito diferente de tantos outros que tem feito – una inquérito minucioso, rigoroso, concludente.

Se ficar provado que a PETROBRAS precisa de uma reforma, que se façam as recomendações necessárias, sem demagogia, patriotadas ou proteções. Se for apurado que políticos transformaram a PETROBRAS num cabide de empregos e numa empresa financiadora de publicações existentes ou hipotéticas, que sejam divulgados os nomes dos empregados e dos empregadores, dos financiadores e dos financiados.

E se o Sr. Link não é o Link autêntico, mas uma espécie de elo perdido numa cadeia de maquinações, que seja substituído. O que não pode continuar é essa situação equívoca em que vive a PETROBRAS, produzindo mais política do que petróleo. Quanto ao mais, só deve haver uma coisa realmente intocável no Brasil: a Lei. E a mais importante das leis é aquela que diz que todo poder emana do povo e em seu nome será exercido. (JB, n° 278)

Por Hiram Reis e Silva (*), Bagé, 22.12.2020 – um Canoeiro eternamente em busca da Terceira Margem.

Bibliografia 

JB, n° 278. Petróleo Paixão e Posse ‒ Brasil ‒ Rio de Janeiro, RJ ‒ Jornal do Brasil, n° 278 (pg. 03), 26.11.1960.

 (*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

  • Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)
  • Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);
  • Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);
  • Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);
  • Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)
  • Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);
  • Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);
  • Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);
  • Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)
  • Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);
  • Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)
  • Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).
  • Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).
  • E-mail: hiramrsilva@gmail.com.

[1]    Anticlinal: designativo da teoria segundo a qual o petróleo migra para as porções mais elevadas das camadas permeáveis.

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