Funai e Unemat promovem oficinas de estudo da língua e produção de material de didático com indígenas Nambikwara

Estudar e aprender na própria língua. O que parece requisito básico para um processo efetivo de ensino e aprendizagem ainda é uma realidade distante de milhares de crianças indígenas no Brasil.

As oficinas de formação de professores e alunos de ensino médio contam com aproximadamente 35 participantes em cada semana. Foto: CTL em Comodoro

Essa foi uma das motivações que, aliada ao propósito de pesquisar aspectos fonológicos da língua Nambikwara, levou a Universidade Estadual do Mato Grosso (Unemat) a implantar, junto aos professores indígenas, um projeto para estudo da língua e produção de material didático adaptado à realidade dessa população. A Funai tem apoiado a realização das oficinas nas aldeias, custeando a alimentação e transporte dos participantes.

Há um ano a etapa do projeto que envolve a formação na aldeia tem sido trabalhada. Durante o evento de uma semana, são formados aproximadamente 35 professores indígenas e alunos do ensino médio das comunidades Nambikwara. Ao total, quatro oficinas já foram realizadas, ocasiões em que compareceram participantes dos subgrupos Wakalitesu, Sawentesu, Kithaulu, Halotesu, Negarotê, Mamaindê, Alantesu, Hahaintesu e Wasusu. Na semana passada (17 a 22 de julho), foi finalizada mais uma formação na região do Vale do Guaporé.

A Coordenação Técnica Local (CTL) em Comodoro II e o Serviço de Promoção dos Direitos Sociais e Cidadania (Sedisc) da Coordenação Regional de Cuiabá são os responsáveis pelo apoio direto aos professores e participantes. Aline Maciel de Carvalho, chefe da CTL, afirma a importância da iniciativa. “Trata-se de um projeto necessário sobretudo porque visa garantir que a educação junto ao povo Nambikwara seja realmente diferenciada, a partir da educação bilíngue e da alfabetização na língua indígena, como deve ser, conforme preconiza a Constituição Federal de 1988.”

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Professor Wellington Quintino durante uma das oficinas. Foto: CTL em Comodoro

Mônica Cruz e Wellington Quintino, doutores em linguística e professores da Faculdade Intercultural Indígena (Faind/Unemat), são os idealizadores do projeto de dois anos que, além das oficinas junto aos professores, conta com diversas etapas de coleta, análise e registro de dados fonológicos, formação de grupo de consultores nativos parceiros na produção dos materiais, entre outras. Mônica explica que a ideia surgiu a partir da demanda trazida pelos próprios indígenas. “Nós temos nos cursos de licenciatura dois acadêmicos Nambikwara e, durante as aulas, eles nos falaram da falta de material didático específico para trabalhar com alfabetização na língua materna na escola. Como trabalhamos com documentação de línguas, resolvemos desenvolver um projeto que não só fosse a campo para documentar dados e promover a produção científica, mas que também beneficiasse a comunidade indígena por conta da falta de professores formados, principalmente para trabalhar com a alfabetização, a escrita na língua. Então, o objetivo maior foi a formação de linguistas Nambikwara para trabalhar nas escolas”, conta a professora que considera primordial a construção do aprendizado estrutural (fonético, morfológico e sintático) da língua para a formação de alfabetizadores.

A língua Nambikwara é muito complexa e apresenta variações entre seus 16 subgrupos étnicos. É considerada pelos linguistas como família isolada, ou seja, não há conhecimento no Brasil e no mundo de parentesco algum com outras línguas indígenas. Hoje, o material didático utilizado nas escolas em Comodoro/MT está disponível apenas em português.

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Alunos indígenas do Ensino Médio também participam da formação. Foto: CTL em Comodoro

Clério Nambikwara, professor indígena e acadêmico da Faind na Barra do Bugres-MT, tem acompanhado de perto as oficinas. Há seis anos lecionando para crianças de nove a 12 anos, ele explica que os alunos apresentam grande dificuldade para escrever devido à alfabetização ser desenvolvida primeiro em português, já que, apesar dos Nambikwara serem bilingues, não usam o português com frequência na aldeia. O professor acrescenta: “Um material didático para os Nambikwara deveria ser todo escrito na nossa língua, desde o estudo das sílabas e o alfabeto, até as histórias, mitos, tudo na língua materna.

Ao mencionar a experiência das oficinas, Clério acrescenta: “O ensino foi muito proveitoso. Descobrimos que a fonética Nambikwara tem 60 vogais entre tons e sons! Os alunos aqui na comunidade interagem muito quando estudamos a nossa língua. Mesmo os alunos que ainda estão na escola, todos têm interesse!”

Kézia Abiorana
Assessoria de Comunicação/Funai, com informações da CTL em Comodoro II

FONTE: FUNAI

 

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