Grupo de Estudos Estratégicos Amazônicos do Inpa debate Piscicultura na Amazônia

A 56ª Reunião do GEEA contou com as palestras dos pesquisadores Christian Jesús Méndez e Dr. Luiz Eugênio Conceição.

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Pela primeira vez na trajetória do Grupo de Estudos Estratégicos Amazônicos (GEEA), a reunião contou com dois palestrantes, o Dr. Christian Jesús Méndez, professor da Universidad Nacional Federico Vilar Real e pesquisador do Instituto de Investigaciones de La Amazonia Peruana (IIAP), e o Dr. Luiz Eugênio Conceição, professor da Universidad de Algarve, Portugal e diretor da empresa Sparos. Os dois pesquisadores são especialistas em aquicultura e desenvolvem pesquisas em cultivo de larvas (larvicultura), reprodução induzida e manejo na criação de peixes.

Conforme o secretário-executivo do GEEA, Dr. Geraldo Mendes, a presença dos pesquisadores no GEAA foi possível porque eles estão em Manaus participando do II Encontro de Pisciculturas na Amazônia Ocidental.

O primeiro palestrante, Dr. Christian, mostrou que nas duas últimas décadas a produção de pescado na piscicultura aumentou consideravelmente, enquanto a produção da pesca de captura na natureza praticamente estagnou, tendendo ao declínio. Para ele, isso pode ser evidenciado não apenas pelo volume de pescado comercializado, mas também pelo tamanho cada vez menor do peixe oriundo da pesca.

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Christian traçou uma panorâmica sobre a aquicultura continental, mostrando que a China é líder absoluto, com mais da metade da produção mundial. Quanto à América do Sul, o Chile se destaca, com cerca de 60%, seguido do Brasil, com 20% da produção desse continente. Na Amazônia, a quase totalidade da produção é baseada no tambaqui (Colossomama cropomum), Pirarucu (Arapaima gigas), matrinxã (Brycon sp), Curimatã (Prochilodus sp), pirapitinga (Piaractus braquipomus), sorubim e pintado (Pseudoplatystoma spp), todas elas destinadas à alimentação humana. Também destacou que muitos piscicultores no Peru estão se dedicando à criação de peixes ornamentais, como os pequenos acarás, do gênero Apistogramma, destinados à exportação.

Dr. Christian afirmou que a piscicultura na Amazônia é muito promissora, mas ainda apresenta desafios relativos à reprodução em cativeiro (caso do pintado) e ao cultivo das larvas e engorda (caso do pirarucu). O problema da engorda se relaciona ao fato de ainda não se ter encontrado uma ração ideal e também ao fato de que a utilizada ainda é muito onerosa, o que acaba inviabilizando a criação em cativeiro, pois o pescado oriundo da pesca extrativa é mais barato e muitos consumidores têm preferência por peixes do ambiente natural.

A engorda do tambaqui não é problemática, porque é um peixe onívoro, isto é, se alimenta de vários itens animais e vegetais e muitos produtores complementam sua alimentação com frutas e verduras regionais. No entanto, isso tem sido um risco, pois pode ocasionar danos à água dos tanques, principalmente pela diminuição do oxigênio, indispensável aos peixes. Para contornar a situação, vários experimentos são feitos na fabricação de ração com a incorporação de matéria orgânica de insumos locais, como a planta aquática Lemna e o triguillo, visando com isso também diminuir o excesso de fósforo que é comum nas rações convencionais, à base de carne e carcaça e também com implicações negativas na qualidade da água.

Ele também relata dois grandes problemas enfrentados pelos piscicultores do Peru: um, com os tanques cavados em terra, nos quais não se pode enxergar os peixes, o que dificulta a visualização de seu estado geral e também a fiscalização para se evitar o roubo. Quem foge desse problema, criando peixes em tanques com circulação de água, também se defronta com outro problema: o alto custo e da energia elétrica e também suas falhas eventuais, o que pode colocar toda a produção a perder em questão de horas.

Outros problemas associados à piscicultura no Peru e, por extensão na América do Sul, dizem respeito ao baixo nível tecnológico em toda a cadeia produtiva, que vai da fabricação da ração à venda do pescado; além disso, as limitações nos processos de gestão empresarial, incluindo a falta de associatividade e de “clusters” empresariais e até mesmo as dificuldades com fontes de financiamento nas investigações técnico-científicas.

Por outro lado, Dr. Christian aponta grandes vantagens e oportunidades na piscicultura do Peru e do continente americano, sendo a principal delas uma crescente demanda mundial por produtos hidrobiológicos “gourmet”, com destaque para peixes regionais de grande porte, como os que vem sendo cultivados na atualidade. Tal potencialidade não diz respeito apenas ao pescado destinado à alimentação, mas também aos subprodutos, como pele, que vem sendo largamente utilizada na confecção de sapatos, bolsas, cintos e outros acessórios da vestimenta, bem como as vísceras, utilizadas para produção de óleo, combustível e adubo.

2ª Palestra      

Dr. Luiz Conceição falou sobre sua empresa, a Sparos Ltda, que tem base tecnológica e que atua na área de nutrição em aquicultura, desenvolvimento de novos produtos e serviços em gestão de recursos hídricos e organismos aquáticos. Para ele, trata-se de uma fábrica-piloto, com o objetivo de desenvolver pesquisas na interface entre universidade e indústria.

Ele cita dados do IBGE, de 2017, dando conta da importância do tambaqui na piscicultura brasileira, mostrando que essa espécie foi responsável por cerca de 89.000 toneladas, quase 20% da produção nacional em cativeiro. Aproximadamente 54.000 toneladas (60% do total) foram produzidas na Amazônia e apenas cerca de 6.000 no Estado do Amazonas.

Luiz Conceição fez um comparativo interessante, mostrando que o peso atingido ao fim de um ano varia enormemente entre os peixes cultivados no Brasil e na Europa. O pirarucu alcança 10 kg, o tambaqui 3 a 4 Kg, enquanto o salmão alcança 200 gramas e o robalo apenas 100 gramas.

Por outro lado, ele mostra o preço médio à saída da piscicultura e isso é muito diferente entres aqueles dois continentes: o pirarucu e tambaqui são vendidos a cerca de R$ 8 o quilo, enquanto o salmão e o robalo são vendidos a R$ 24 a R$ 28 o quilo. Esse fato, por si só atesta o enorme potencial dos peixes e da piscicultura amazônica em relação a outras partes do mundo, carecendo apenas de tecnologias apropriadas para o cultivo e bom marketing. Para ele, é preciso ter muito cuidado no trtato dos peixes, evitando que certos preconceitos, erros ou abusos possam ser mal interpretados e veiculados pela mídia, com implicações negativas no consumo do pescado.

Ele também aponta os pontos fortes e fracos da piscicultura. Como fortes, ele destaca as espécies de crescimento rápido e com alto valor no mercado; a área cultivável disponível; os recursos humanos já treinados e as tecnologias já à disposição no mercado. Como pontos fracos, menciona a disponibilidade de alimentos de qualidade que competem com o pescado; a dificuldade na obtenção de ingredientes a bom preço; o custo de transporte frente às longas distâncias entre a produção e mercado consumidor e às dificuldades operacionais para exportação.

Ele também fala de ameaças, mencionando conflitos entre exploração e proteção do ambiente e a necessidade de reduzir impactos ambientais reais e percepcionados. Também destaca a comunicação eficaz com a sociedade para explicar vantagens da piscicultura e anular os mitos e falsas ideias, por exemplo, a de que peixes comem maus alimentos, que use usa antibióticos em demasia, que peixes sofrem nos cultivos. De mesmo modo, os conflitos pela ocupação do espaço entre a agricultura e tanques escavados e também entre uso de tanques de rede na superfície de lagos e o transporte fluvial.

Dr. Luiz também cita algumas medidas que podem aumentar as possibilidades da piscicultura amazônica, como, por exemplo, mantendo o foco em espécies nobres, de alto valor nutritivo e boa carga genética; o aumento do volume de produção para reduzir custos de transporte; a integração e associativismo entre piscicultores; a melhoria das condições de criação, abate, transporte e comercialização; o cuidado com o bem estar animal e, consequentemente, a melhoria na qualidade da carne; a melhoria da tecnologia dos cultivos e da gestão da água e impulso ao desenvolvimento de processos de certificação para valorizar os produtos oriundos da piscicultura.

Ele mostra que a piscicultura não é uma atividade perfeita, onde tudo funciona maravilhosamente bem. Para isso lembra que ela pode provocar poluição da água, escape de espécies exóticas que podem competir e prejudicar as espécies locais. No entanto, a criação de peixes é o trunfo que todas as instituições mundiais esperam contar para manter a segurança alimentar e combater a fome de sociedades que não param de crescer e demandar por pescado de boa qualidade.

Segundo ele, somente pela multiplicação dos peixes é que a humanidade poderá continuar se nutrindo dessa importante fonte de alimento saudável. A Amazônia pode e deve contribuir enormemente para isso, além de poder gerar emprego e renda para comunidades que vivem em áreas remotas e carentes de desenvolvimento econômico. É importante não somente aumentar a produção, mas também fazer com que ela seja de fato ecointensificada, isto é, feita com respeito ao meio ambiente. Sem isso, nem ela nem as demais atividades correlatas serão sustentáveis.

Questionado sobre a pertinência de se desenvolver a piscicultura nas grandes áreas dos reservatórios de hidrelétricas da Amazônia, ele se mostra favorável, afirmando que estas áreas já estão estabelecidas, que os principais impactos já ocorreram e que aproveitá-las em benefício da produção de alimentos é uma iniciativa positiva e que poderá ajudar a combater a fome no Brasil e no mundo, objetivo maior da piscicultura.

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Ao final, Dr. Geraldo Mendes, passou um Certificado aos palestrantes, através das mãos das organizadoras do II Encontro de piscicultores da Amazônia Ocidental e apoiadoras da vinda deles ao GEEA, a Dra. Elizabeth Gusmão e Dra. Ligia Gonçalves, pesquisadoras do Inpa.

Da Redação – GEEA   FONTE: INPA  

 

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