Crise de energia da Venezuela estraga sorvete e cinema em Roraima

A fábrica de sorvetes já teve prejuízo de R$ 15 mil num único dia. No cinema, além de devolver ingressos por sessões interrompidas no meio dos filmes, um projetor queimou e gerou perda de R$ 210 mil. Na lavanderia, as roupas são entregues com atraso.   

Único Estado fora do sistema energético interligado, Roraima vive um mundo à parte e vê seus 505 mil habitantes se transformarem em “reféns” da crise da Venezuela no fornecimento de energia -na quinta (21), o governo de Nicolás Maduro anunciou que passará a suspender o fornecimento por quatro horas diárias em todo o país -exceto a Grande Caracas.

Dependente de energia vendida pelo governo da Venezuela e de termelétricas, Roraima enfrentou dez apagões, alguns de até 12 horas e com desligamento total do sistema, no primeiro trimestre. Em 2015, foram outros 14, segundo relatório do governo ao qual a Folha teve acesso.

Roraima depende praticamente de uma linha de transmissão entre os dois países, o linhão de Guri, que opera desde 2001 e cujo contrato estabelece fornecimento até 2021.

O problema é que a Venezuela, devido a problemas de manutenção, tem entregado menos energia que o contratado, segundo a governadora Suely Campos (PP), e o restante é suprido por termelétricas. Isso quando não falta diesel para elas operarem.

Em março, um curto-circuito na rede de Guri obrigou o Estado a ligar as três termelétricas, o que gerou falta de combustível. Resultado: mais 12 horas sem energia.

O contrato de 2001 prevê fornecimento de 210 MWh, para um consumo no horário de pico de 184 MWh, mas o total enviado foi caindo e houve época de envio de só metade -95 MWh. “Vivemos uma insegurança energética muito grande”, disse Campos.

Em fevereiro, foram três dias seguidos de queda à noite -em dois, as interrupções superaram dez horas.

“Estamos muito preocupados. No dia em que ficamos 12 horas sem energia, tivemos um prejuízo de R$ 15 mil, porque perdemos parte do que estava produzido e ainda ficamos parados. Não temos gerador”, disse Caio Ferreira, dono da fábrica de sorvetes.

No maior cinema da cidade, também não há gerador. “Quando falta energia no meio do filme, temos de devolver o dinheiro para o cliente, que fica aborrecido e não aceita voltar em outra sessão”, disse Francisco Weiber, gerente. Segundo ele, numa das quedas, a sala perdeu um projetor de R$ 210 mil.

FESTA CURTA

Em dezembro, houve festa quando a presidente Dilma Rousseff visitou a capital, Boa Vista, e anunciou que enfim o Estado seria inserido no mapa energético do país, com a construção de 721,4 quilômetros de linhas de transmissão, atravessando Amazonas e Roraima, passando por nove cidades e terras indígenas.

Só não contavam com uma liminar da Justiça que suspendeu os efeitos da licença concedida pelo Ibama. O motivo: falta de consulta prévia aos índios uaimiris-atroaris.

Segundo o Ministério de Minas e Energia, o processo de licenciamento ambiental tem encontrado dificuldades pelo fato de 123 quilômetros da linha de transmissão passarem pela terra indígena.

A Funai (Fundação Nacional do Índio) argumenta, em documento de novembro, que informou que não havia consenso ou discordância dos indígenas sobre o tema e que seria preciso esperar esse entendimento para que o cronograma seguisse.

A manifestação da fundação, órgão indigenista oficial, é obrigatória em licenciamentos de obras que afetem direta ou indiretamente comunidades indígenas e suas terras.

Em março, a liminar foi suspensa, mas até que as licenças sejam obtidas a previsão é que as obras sejam retomadas apenas em novembro. A interligação Manaus-Boa Vista foi leiloada em 2011, e a estimativa inicial era que entrasse em operação em janeiro do ano passado.

O Ministério de Minas e Energia informou que a previsão atualizada, após a queda da liminar, é que a obra da linha de transmissão –atualmente em busca da licença de instalação– seja concluída em julho de 2018.

Sobre a falta de diesel para abastecer as termelétricas, o ministério informou que o problema foi pontual e já está solucionado.

Por: Marcelo Toledo e Camila Dall’agnol
Fonte: Folha de São Paulo

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