Sentença suspende licenças da usina São Manoel, mas não entra em vigor por aplicação de instituto jurídico da ditadura

A Justiça Federal em Cuiabá sentenciou processo judicial sobre o licenciamento da usina hidrelétrica de São Manoel, no rio Teles Pires, na divisa entre o Pará e o Mato Grosso, suspendendo as licenças concedidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama)  por falta de estudos de impactos sobre os indígenas Kayabi, Apiaká e Munduruku, atingidos pela obra. Como em outros processos que discutem irregularidades em obras do governo federal na Amazônia, a sentença não vai entrar em vigor e a obra deve continuar, por conta da aplicação do instituto jurídico da suspensão segurança.    

Inserida no ordenamento jurídico pela ditadura militar, a suspensão de segurança permite a continuidade de obras e políticas consideradas essenciais pelo governo por razões de economia pública. No caso de São Manoel, logo após a concessão de liminar também pela Justiça do Mato Grosso, a Advocacia-Geral da União conseguiu a suspensão com a presidência do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília. Para o juiz Ciro José Arapiraca, a análise de toda a documentação do processo demonstra a ausência de estudos adequados sobre os impactos da usina nos indígenas, o que seria pressuposto lógico para o licenciamento do empreendimento.

A barragem é uma das sete projetadas pelo governo para o rio Teles Pires e fica a menos de um quilômetro de distância da terra indígena Kayabi, uma das afetadas. Por causa das obras, já foram detectados graves impactos nas aldeias que ficam na área de influência, sem mitigações ou compensações previstas por conta da ausência dos estudos.

A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), responsável pelos estudos, alegou na Justiça que os problemas apontados pelo Ministério Público Federal (MPF) em 2013 – quando a ação foi ajuizada – já teriam sido sanados. Mas o juiz registra na sentença que a alegação não foi comprovada. “Registre-se que a EPE não fez juntar aos autos qualquer novo estudo ambiental da envergadura de um EIA [estudo de impacto ambiental], constando nele o ECI [estudo de componente indígena], o que evidencia que a referida empresa pública ainda não promoveu as obrigações que lhe competiam, ferindo os interesses ambientais e indígenas que merecem especial proteção, conforme determinação constitucional.”

A ação do MPF se baseia em pareceres da Fundação Nacional do Índio (Funai), autarquia do próprio governo federal responsável pela defesa dos direitos indígenas. De acordo com a Funai, os estudos entregues pela EPE sobre a usina eram incompletos e os programas apresentados à título de mitigação e compensação de impactos, “insuficientes”.

Segundo a Funai, faltou planejamento para ações integradas em proteção territorial, proteção aos índios isolados, proteção à saúde, monitoramento participativo da qualidade da água, da fauna e das espécies de peixes. Falta também planejamento para ações integradas de gestão territorial e ambiental, de recuperação de áreas degradadas, de formação e capacitação, de comunicação social, de educação ambiental, geração de renda, valorização cultural do patrimônio material e imaterial, entre outros itens ausentes.

Para o MPF, a falta de estudos e planejamento é ainda mais grave por se tratar de um processo de licenciamento que, segundo palavras da própria Funai, é marcado “por conflitos e tensões, e alguns confrontos diretos” e em que o estudo do componente indígena está sendo feito de qualquer maneira, “apenas para cumprir tabela”.

Processo nº – 0013839-40.2013.4.01.3600 – 1ª Vara Federal em Cuiabá (MT)

FONTE:  Ministério Público Federal no Pará  /  Assessoria de Comunicação  

 

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