Forças Armadas não são “gendarmeria verde” (*)

O governo federal acaba de anunciar uma concessão descabida ao movimento ambientalista internacional, com a decisão de criar uma força nacional de segurança ambiental permanente para operar na Amazônia Legal, a ser constituída com quadros das Forças Armadas. Segundo a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, a nova força de proteção ambiental deverá ser integrada por quadros do Exército, com o auxílio da Marinha e da Aeronáutica, e terá atuação permanente na região, independentemente da sazonalidade dos desmatamentos, que têm se concentrado em períodos de chuva. “Não sairemos mais da Amazônia Legal, mesmo com chuva. Todo mundo espera que a gente saia na [época da] chuva, para desmatar”, disse ela à Agência Brasil (10/10/2012).

A ministra disse ainda que o novo modelo de fiscalização adotado pelo governo também incluirá a participação dos serviços de inteligência militares, que contarão com a colaboração de outros órgãos do governo. “Mudou todo o arranjo de inteligência ambiental e de ação coordenada das entidades federais. Vamos trabalhar com o Exército, Marinha e Aeronáutica. Vamos contar com a inteligência militar”, afirmou ela.

O novo programa de combate ao desmatamento, intitulado Proteger Ambiental, é uma resposta do governo brasileiro ao recente aumento do desmatamento na Amazônia Legal. Em agosto deste ano, segundo o Sistema de Monitoramento em Tempo Real do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o desmatamento na Amazônia Legal foi quase 200% maior que a área desmatada no ano passado. Ao comentar tais números, Teixeira explicou que uma grande parcela de tal desmatamento se deu em razão da seca em parte da região: “Dos 522 quilômetros quadrados em agosto, 40% estão associados a desmatamento [corte raso] e 60% a degradação, que inclui queimadas. É um período atípico, com intensificação de queimadas pela seca.”

Sem desmerecer a importância do monitoramento de atividades ilícitas nas áreas de florestas, envolver as Forças Armadas de forma permanente em atividades que cabem aos órgãos ambientais, em especial, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), constitui um sério desvio de função institucional. Uma coisa é solicitar, de forma eventual, apoio logístico e operacional para certas tarefas que ultrapassem a capacidade dos órgãos ambientais; outra, bem diferente, é convertê-las numa “gendarmeria verde”, função que passa a anos-luz de suas atribuições constitucionais.

Ademais, há dois aspectos importantes que não podem ser menosprezados. Um é o quase inevitável desvio de recursos humanos e materiais – aeronaves, embarcações etc. – já escassos, para atividades fundamentais desempenhadas pelas Forças Armadas na região, como a presença física e a vigilância nas fronteiras e, não menos, a assistência médica, social e logística às populações de localidades isoladas.

O outro é que, ao atuar como polícia ambiental, as F.As. se tornam parte integrante de um processo que, devido à atitude passiva de sucessivos governos nacionais, desde o final da década de 1980, se converteu em uma séria ameaça à própria capacidade soberana de o País determinar a sua dinâmica de ocupação territorial e os seus projetos de desenvolvimento. Em um contexto no qual as intervenções motivadas por questões ambientais, promovidas por um vasto aparato internacional de organizações não-governamentais (ONGs) e órgãos governamentais estrangeiros, com uma agenda política que deixa pouco espaço para os interesses nacionais maiores, constituem uma autêntica estratégia de “guerra de quarta geração”, seria, no mínimo, irônico engajar as Forças Armadas em um esforço orientado, primariamente, para o público internacional.

Neste particular, chega a ser risível destacar os serviços de inteligência militares para monitorar desmatamento e outras atividades do gênero, colocando-os para atuar ao lado das ONGs ambientalistas – que, estas, sim, deveriam ser objeto da sua atenção.

É lamentável que as autoridades brasileiras continuem considerando que a questão ambiental na Amazônia seja, essencialmente, um problema de vigilância policial, em vez de se empenharem em promover um amplo processo de desenvolvimento integrado da região, começando pela regularização fundiária e a realização de um amplo zoneamento ecológico-econômico, para ordenar as atividades econômicas e de conservação ambiental em toda ela.

É deveras lamentável que a ministra Izabella Teixeira, que tem dado repetidas demonstrações de uma visão profissional e técnica dos problemas ambientais, em contraste com seus dois antecessores imediatos, tenha adotado essa linha de ação.

Esperemos que outros setores da sociedade reajam a semelhante absurdo.

FONTE : www.alerta.inf.br; msia@msia.org.br

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