Senador cobra do governo mais diálogo com os índios e critica texto aprovado pela comissão que analisa MP do Código Florestal

A cerimônia anual do Kuarup realizada neste fim de semana na aldeia Yawalapti, no Parque Nacional do Xingu, em Mato Grosso, teve um forte ingrediente político testemunhado pelo senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF). Tradicionalmente, o ritual consiste numa celebração religiosa fúnebre em que os índios do Alto Xingu homenageiam seus mortos. Desta vez, eles também estamparam faixas sobre as ocas protestando contra a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte e outras ações governamentais consideradas lesivas a 16 povos, além de divulgar um manifesto lido pelo parlamentar em discurso nesta segunda-feira (20).

– No momento solene, no meio da cerimônia, o Cacique Aritana leu um documento dirigido à Presidente Dilma Rousseff mostrando a preocupação dos povos do Xingu com algumas medidas, propostas, que estão em tramitação no Congresso Nacional, ou algumas medidas adotadas pela Presidência da República, que, no entender deles, vão gerar danos e problemas graves para a sobrevivência, para a qualidade de vida dos povos indígenas do País, e especialmente para os povos do Xingu – relatou o senador, que nunca antes havia estado no parque.

O parlamentar disse que os índios estão muito preocupados com as pressões sobre o Xingu, especialmente em torno das nascentes do rio, que ficaram de fora da área do parque e hoje estão ameaçadas. Os índios se insurgem igualmente contra as propostas em tramitação para regulamentação das atividades de mineração em terras indígenas.

“É urgente que o Estado brasileiro faça mais do que valorizar as culturas indígenas de forma simbólica. É preciso que, na prática, sejam garantidos a manutenção e o cumprimento dos direitos já conquistados. Esta, sim, seria uma manifestação verdadeira de respeito aos povos indígenas, algo de que o Brasil poderia se orgulhar de mostrar ao mundo”, diz o documento, referindo-se ao fato de que o governo brasileiro utiliza a imagem dos povos indígenas como estratégia de marketing para realizar as Olimpíadas de 2016, num contraste “com o crescente e assustador retrocesso de direitos”.

Contradições

O senador informou ter pedido um estudo à consultoria do Senado Federal sobre a Portaria nº 303, da Advocacia-Geral da União, que permite intervenções e grandes obras em territórios indígenas sem consulta prévia. No entender de Rolemberg, parece haver contradição em relação à Convenção nº 169 da OIT, que tem status de lei ordinária no Brasil, mas também uma contradição em relação a todo o processo de licenciamento ambiental no Brasil, que prevê a audiência pública das comunidades.

-É um contrasenso não ouvir as comunidades indígenas. Nem sempre é preciso concordar com os povos indígenas. Mas considero absolutamente essencial para a legitimidade do processo democrático que eles sejam ouvidos, até porque tenho convicção de que eles têm muito a dizer e também muito a nos ensinar – disse o senador mencionando o respeito dos índios pela natureza.

Nesse documento, eles pedem a ação enérgica do Governo Federal para garantir a proteção de matas ciliares e áreas de preservação permanente, tendo em vista a crescente degradação das cabeceiras dos rios que atravessam e alimentam as terras indígenas, de acordo com relato do parlamentar. Rollemberg se diz preocupado com recente mudança na medida provisória do Código Florestal capaz de ampliar o desmatamento, especialmente no cerrado amazônico.

– Fizemos sobrevoo nas áreas próximas ao parque, onde há uma conservação grande, mas à medida em que se vai afastando do parque há um processo de desmatamento bastante forte, muitas vezes sem respeitar as áreas de preservação permanente, o que está levando à degradação das nascentes do Rio Xingu, rio estratégico inclusive para a geração de energia elétrica futuramente no País – advertiu o senador.

Além dos Yawalapti, participaram do Kuarup deste ano no município de Gaucha as etnias Camaiurá, Kalapalo, Cuicuru, Aurá e Meinako, entre outras. Assinam o manifesto as organizações Associação Terra Indígena Xingu (ATIX); Instituto de Pesquisa Etnoambiental do Xingu (IPEAX); Portal do Xingu; Associação Yawalapíti Awapá (AYA); Associação Tulukai Waurá; Associação Mavutsinim Kamayurá; Associação Indígena Kuikuro do Alto Xinzu (AIKAX); Associação Moygu Comunidade Ikpeng (AMCI); Associação Indígena Kisêdjê (AIK); Associação Uyaipiuku Mehinako; Associação Indígena Yarikayu Yudjá; Centro de Organização Kawaiwetê; Associação Aweti.

Da parte dos Povos indígenas do Xingu, o documento é assinado por Yawalapíti, Trumai, Ikpeng, Waurá, Kamayurá, Kuikuro, Kalapalo, Nahukwá, Matipu, Aweti, Mehinako, Yudjá, Kisêdjê, Kawaiwetê, Naruvutu, Tapayuna.

O senador foi convidado para a cerimônia pela Fundação Darcy Ribeiro, que leva o nome de um dos homenageados deste ano.

– Foi uma das experiências mais marcantes da minha vida – afirmou.

No mesmo pronunciamento em que relatou a visita ao Parque Nacional do Xingu para assistir a cerimônia do Kuarup, o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) criticou dois pontos aprovados pela Comissão Mista Especial que analisa a Medida Provisória 571/2012. A MP visa corrigir as lacunas deixadas pelos vetos da presidente Dilma Rousseff ao Código Florestal, que foi aprovado pelo Congresso Nacional no início do ano.

 

Para o parlamentar, o texto da comissão, encarregada de dar um parecer sobre a matéria, abre “a possibilidade de uma ampliação extremamente danosa das possibilidades de desmatamento, especialmente no cerrado amazônico”:

– O que diz ali claramente é o seguinte: que qualquer propriedade de cerrado na Amazônia que tiver mais de 15% da sua área em áreas de preservação permanente poderá desmatar a mais na reserva legal – afirmou o parlamentar, acrescentando que a alteração “foi incluída no finalzinho do primeiro semestre, em uma última reunião da Comissão Especial, sem que houvesse uma discussão sobre aquele tema”.

Rollemberg afirmou que essa modificação será “extremamente danosa” na região do Xingu, que é uma área de transição entre o cerrado e a floresta.

– A gente já percebe que, à medida em que se vai afastando do parque, há um processo de desmatamento bastante forte, bastante grande, muitas vezes sem respeitar as áreas de preservação permanente, o que está levando à degradação das nascentes do Rio Xingu, rio estratégico, inclusive para a geração de energia elétrica no país – afirmou o parlamentar.

A proteção das matas ciliares e áreas de preservação permanente foi pedida pelo cacique Aritana durante a cerimônia do Kuarup, em documento endereçado à presidente Dilma Rousseff e lido em Plenário pelo senador.

Intermitentes

Rodrigo Rollemberg criticou ainda outro item aprovado pela Comissão Mista, para ele uma “insensatez absoluta, aprovada por uma margem pequena de votos”. A medida desobriga a existência de áreas de preservação permanente ao longo dos rios intermitentes, que não são perenes, ou seja, que não têm água durante todo o ano.

Para o senador, trata-se de “um contrassenso”, uma vez que “os rios intermitentes também alimentam rios perenes, são importantes para os rios perenes e são muito importantes também para o abastecimento de águas, no período em que correm, para as populações humanas e para as populações animais”.

– Essa atitude é um tiro no coração da sustentabilidade da agricultura brasileira – afirmou o parlamentar, citando como exemplo o Rio Jaguaribe, grande rio do semiárido, que seca nos períodos de severas estiagens. Para ele, os rios intermitentes precisariam de um cuidado redobrado, ao contrário do que prevê o texto aprovado pela Comissão Mista Especial.

FONTE : Agência Senado

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